quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Como Pactuar o Cuidado? O papel do papel...


Hoje tive uma experiência estressante. Uma pessoa que trabalha comigo, mediante uma explicação minha, disse que senão havia nada no papel, não valeria de nada, aquilo que eu havia dito e/ou feito. Eu havia dito que já havia realizado um atendimento a uma referida pessoa, eu e outra colega, juntos, na consulta compartilhada. Essa colega é da própria unidade, e eu sou uma espécie de apoiador dessa unidade de saúde.

Uma vez li um artigo, que me lembre, relatava um trabalho de umas psicólogas em um hospital. Onde um ponto do trabalho que ressaltavam, era exatamente esse trabalho “informal”. Esse trabalho de conversa no corredor, de maneira quase que “indireta”.
Uma vez eu ouvi um grande professor falar sobre a “imaterialidade” do trabalho que um profissional de saúde faz. E de sua significância, e de como existe essa tensão para materializá-lo (esse trabalho).

Então, como demonstrar esse trabalho? Por meio de um papel?
Acho que é até importante para os nossos “superiores”, e para nos “resguardar”, a questão do papel. Mas ele nunca pode ter penso eu, essa característica de intimidação, ou até de proporcionar essa sensação “vazia” de “dever cumprido”. Intimidação no sentido de apontar: você não fez isso, ou mesmo, você não anotou aquilo. É sempre muito complicado quando uma equipe de saúde como a nossa, começa a trabalhar com papéis Uma vez que a nossa equipe tem que se agregar a uma outra equipe, que também trabalha com papéis. Vira um “bolo de papéis”.
Claro que os papéis de alguma maneira, pactuam também responsabilidade. Porém, penso que nunca deve ser para prejudicar ninguém, no sentido de materializar uma “prova” do que está sendo ou não sendo realizado. Mas esse papel deve ter sim, um papel para que nos orientemos por meio deles, que sirvam eles, como um “apoio” a memória por exemplo. Para que ele venha nos lembrar do que já foi ou não realizado. E não seja utilizado como uma espécie de “arma” contra o outro.

Acho que o papel retira muito algumas coisas que para mim são preciosas: como o pensar, a espontaneidade, a construção da própria consciência de cuidado, de co-responsabilização.

O papel burocratiza as relações, tornando-as alienantes.

Como é que eu vou relatar as conversas (ações/intervenções) que eu tenho com os colegas, no itinerário das visitas domiciliares que realizo? Não existem campo nos papéis para o preenchimento dessas práticas.
E uma última coisa, é que eu acho que esses papéis deveriam é ficar sempre com a unidade de saúde local, e não na nossa, de apoio. Acho que nós deveríamos recusar esses papéis. Mas eles nos foram impostos, e estão também conosco.

Para mim esse negócio de papéis nasce da insegurança, do medo.
Lembrei-me de quando eu entrei aqui na rede de saúde, e trabalhava em outra unidade, de maneira muito mais “fixa”. Eram tantos papéis, que ao invés de trabalhar em uma unidade de saúde, tinha a sensação de estar era trabalhando em um banco. Era ficha de acolhimento, de anamnese, de relatório do dia, de escrever no sistema, de anotações, folha de ponto, entre outros... Além de ser muito chato tudo isso.