segunda-feira, 17 de março de 2014

La Vida És Un Carnaval


 

Celia Cruz


Todo aquél que piense
Que la vida es desigual
Tiene que saber que no es así
Que la vida es una hermosura
Hay que vivirla

Todo aquél que piense
Que está solo y que está mal
Tiene que saber que no es así
Que en la vida no hay nadie solo
Y siempre hay alguien

Ay, no hay que llorar,
Que la vida es un carnaval
Y es mas bello vivir cantando
Oh oh oh ay, no hay que llorar
Que la vida es un carnaval
Y las penas se van cantando

Ay, no hay que llorar,
Que la vida es un carnaval
Y es mas bello vivir cantando
Oh oh oh ay, no hay que llorar
Que la vida es un carnaval
Y las penas se van cantando

Todo aquél que piense
Que la vida siempre es cruel
Tiene que saber que no es así
Que tan solo hay momentos malos
Y todo pasa

Todo aquél que piense
Que esto nunca va a cambiar
Tiene que saber que no es así
Que al mal tiempo, buena cara
Y todo cambia

Ay, no hay que llorar,
Que la vida es un carnaval
Y es más bello vivir cantando
Oh oh oh ay, no hay que llorar
Que la vida es un carnaval
Y las penas se van cantando

Ay, no hay que llorar,
Que la vida es un carnaval
Y es más bello vivir cantando
Oh oh oh ay, no hay que llorar
Que la vida es un carnaval
Y las penas se van cantando

Para aquellos que se quejan tanto
Para aquellos que sólo critican
Para aquellos que usan las armas
Para aquellos que nos contaminen
Para aquellos que hacen la guerra
Para aquellos que viven pecando
Para aquellos que nos maltratan
Para aquellos que nos contagian
 
 

Uma desmontagem humanizada através de fotografias em Saúde Coletiva*

Carlos Alberto Severo Garcia Júnior1
Radilson Carlos Gomes2

INTERFACE -  COMUNICAÇÃO SAÚDE EDUCAÇÃO v.17, n.47, p.995-1002, out./dez. 2013
 


Figura 1. Agente Comunitário da Saúde, Cuiabá

Vida-família. Cozinha, ponta de alimento, porta de entrada.

Cozinha-família, entrada da vida. Domicílio, meio de vida,

meio da vida. Visita, todos entram. Visita domiciliar, aquela

em busca (se ativa). Tempo de conversas, barriga cheia e

calor. Tempo de silêncio, panela vazia e desânimo. A imagem

além de compor contrastes de luzes e momentos, apresenta

uma abertura para enxergarmos a partir de um lugar de

“dentro”, ao mesmo tempo, um lugar de “fora”, e perder-se

naquilo que não se vê. Tem-se a proteção de paredes entre a

vida pública e a vida privada. A saúde (ora pública) tenta

entrar na casa (ora privada) pela porta aberta. Vida e família,

bem público-privado, porta de entrada de tudo.

 

Figura 2. Casa de Saúde Indígena, Itacoatiara, Amazonas

“Dona de divinas tetas, derrama o leite bom na minha cara e

o leite mau na cara dos caretas”, diria Caetano Veloso na

música “Vaca Profana”. Leite, alimento sagrado e

acalentador. Seios e bustos, imagem divina da vida. Vida

fértil, vida pulsante. História revelada na transmissão e na

passagem do líquido. Hoje, mãe. Ontem, jovem. Amanhã,

senhora. Entre rios, sinuosas margens que revelam a mãe

natureza resguardada pela vida ainda humana. Um olhar

feminino. Mulheres, mães, meninas e avós de um povo que

carrega uma herança. Uma cultura com seus respeitos e seus

rituais. Entre redes, entre pontos, entre vidas. A

naturalização de vidas em redes. Num primeiro plano: olhos

abertos-acima, atentos ao fora. No segundo plano: olhos

fechados-abaixo, atentos ao cuidado (dentro).

 

 

Figura 3. Unidade Básica de Saúde, Parnaíba, Piauí

Uma mesa em distâncias. Entre histórias de distâncias e

distâncias de histórias, mulheres e crianças numa ciranda.

Uma família viva, uma passagem de tempo, em busca de

cuidado. Perguntas: quem quer atenção quer encontrar

solução? Quem escuta visa qual saída? Quem olha, diz o

quê? Com licença, doutora, entramos aqui para saber o

que temos, mas acho que só sabemos o que não temos.

 

Figura 4. Colônia de hanseníase, Colônia João Paulo II – Marituba, Pará

Tem fogo? Indagaria parado. Como se o caminho já não

revelasse nenhuma surpresa. Um caminho que há muito se

caminha sabendo para onde se vai. Já foram deixados pelo

percurso alguns restos de cinzas. Fogo? Claro! Prazeres e

paixões não se esvaem em si mesmas, elas conduzem

caminhos, avisam aos menos atentos. Sinais e alertas que

advertem, dizem de sua saúde. Caminhar parado e rodar em

rodas. No escuro, num corredor solitário, vive restos e fumaças.

Se já lhe amputaram as pernas, do que lhe servem, se o corpo

segue a andar?

 

Figura 5. Atendimento domiciliar, periferia de São Paulo, SP

Planos em três porções, divididos entre pequenos objetos

humanos. Conversas e condições. Mulheres postas a dialogar sobre

a vida, banalidade em forma de uma tela. Um emaranhado de

semicoisas entre a vida. Vale a pena ver de novo. Quem não vê

perde a chance de chegar, e quem chega é porque quis ver. Uma

visita abre o impulso de organizar a casa. O estranho que entra

sempre pode estranhar aquela casa. Como se tentássemos mostrar

um pouco daquele outro que não somos. Um visitante impõe um

reajuste. O relógio, a mobília, a bagunça habitual da vida passa a

ser um possível desconforto.

 

Figura 6. Ananindeua, Pará

Pressões e marcas, impressões de expressões. Pressões e

contrastes, menção de tensão. Se o olhar e o vento não

conseguem revelar um tempo ou, mesmo, um lugar, ao menos,

pode-se ter um instante já-mais (Garcia, 2013) o mesmo.

Instante já-mais o mesmo é incapacidade de prender, escolha

de extrair o medo e o fim. Entre medidas capazes de relevar a

normalidade, temos sujeitos comuns, vida legítima, base sólida

de um território. Medidas e médias. Normalização que varre

extremos que jamais se tocam. Minha amiga, como vai você?

Ainda que não nos conhecemos, mas sei quem é você. Você

entrou em minha casa e esqueceu-se de dizer seu nome. Pediu

uma xícara de açúcar, um pedaço de pão e nunca mais voltou.

Deixou de aparecer. Por favor, apareça minha amiga, e diga

quem realmente é você.

 

Colaboradores

Os autores trabalharam juntos na concepção desta publicação. Carlos Garcia Jr.

produziu o texto e Radilson Carlos Gomes fotografou as imagens.

 

Referências

GARCIA, S. Marginais. Rio de Janeiro: Multifoco, 2013.

KOSSOY, B. Os tempos da fotografia: o efêmero e o perpétuo. Cotia: Ateliê

Editorial, 2007.

 


domingo, 16 de março de 2014

"Infelizmente, o gari é muito mais visto e lembrado na sua ausência."

Para gari escritor, protestos de 2013 inspiraram greve

Carolina Mazzi
Do UOL, no Rio
 
 
Júlio César Guimarães/UOL
Haroldo César, 51, é gari há 29 anos no Rio de Janeiro e já escreveu três livros
Haroldo César, 51, é gari há 29 anos no Rio de Janeiro e já escreveu três livros
 
Haroldo César já dedicou mais de metade da sua vida à profissão de gari. Aos 51 anos, a ocupação, que já exerce há 29, não é apenas fonte do seu salário, mas também inspiração para as histórias e crônicas que conta em seus livros. Desde 2008, ele já lançou três obras, todas de forma independente.
Em entrevista exclusiva ao UOL, o carioca do Engenho da Rainha, bairro do subúrbio, comenta sua paixão pela escrita, que começou em um bar perto de casa, onde se reunia para compor sambas com amigos. E a importância da sua profissão, responsável por, segundo ele, "tudo" que conquistou.
"Infelizmente, o gari é muito mais visto e lembrado na sua ausência. Quando está tudo limpinho, ninguém percebe".
Para Haroldo, as manifestações de 2013 foram grande fonte de inspiração para os profissionais que organizaram a greve durante o Carnaval deste ano, quando a cidade ficou mergulhada em lixo depois que os garis se recusaram a trabalhar, reivindicando aumento salarial.
Compositor de samba, escritor e roteirista, Haroldo ainda tem planos de lançar uma peça de teatro e mais um livro em breve. E continuará como gari, contribuindo com a sua parte para a limpeza da cidade.
Leia a íntegra da entrevista:
UOL: Como surgiu a vontade de escrever um livro?
Haroldo César:
Foi uma coisa inesperada, apesar de eu ser um amante da arte e da cultura. A minha origem na arte, na verdade, é na composição de samba. Durante muito tempo tive uma birosquinha perto de casa, onde reunia os amigos para fazer samba. O nosso sonho, na época, era gravar um disco. Mas, assim que conseguimos dinheiro para fazer, houve uma dissidência e cada um seguiu o seu caminho. Eu, que não sou músico nem cantor, fiquei perdido. E aí, fiquei naquela, "e agora, faço o quê?".
Júlio César Guimarães/UOL
Capa de livro escrito pelo gari Haroldo César, 51, do Rio

Nesta mesma época minha mulher comprou um computador e comecei a escrever sobre as duas coisas que mais conheço: composição de samba e vida do gari. E aí fui escrevendo, escrevendo e, como não tinha mais aquele compromisso com o samba, consegui terminar o livro "Garimpando Composições" em 2008.
UOL: Além de "Garimpando Composições", você já lançou mais dois livros. Como você faz a publicação?
Haroldo:
Quando resolvi publicar os livros, tive que fazer uma produção independente mesmo, coloquei a mão no bolso e gastei. Aliás, gastei não, investi e fiz algumas tiragens. Aí, com o material em mãos, comecei a vender. Em 2012, lancei o "Vida de Gari, que são crônicas do dia a dia do gari, de histórias que ouvia dos colegas, ou histórias que criava eu mesmo sobre situações que poderiam acontecer na rotina de trabalho. Este livro foi muito importante para mim, porque me deu uma visibilidade maior. Dei muitas entrevistas para rádio, TV, matérias de jornal. Ele me deu uma projeção grande.
E no ano passado, lancei "Toda família sambista", que é sobre a vida entre uma comunidade e a escola de samba do lugar. As histórias são inspiradas naquilo que eu conheço, na minha base, também moro em comunidade com escola de samba, também sou escritor e compositor. As minhas histórias são ficcionais, mas contam histórias que eu conheço.
UOL: A sua profissão é uma fonte de inspiração para você. O que representa ser gari na sua vida?
Haroldo:
Ser gari para mim representa praticamente tudo. Eu vou fazer 30 anos na empresa, entrei na função direta de gari, trabalhei por dois anos. Depois fui para o escritório, aí fui fazendo outras coisas. Mas minha vida toda está ligada a esta base, que é o gari. Então, a minha vida toda fiz poesia, música para o gari. Esse universo da limpeza urbana, do gari, é tudo na minha vida, me acompanha desde sempre. O pouco que eu conquistei na vida hoje devo à profissão. Inclusive as histórias que me inspiraram a escrever meus livros e praticamente tudo na minha vida, inclusive na parte profissional, do salário, do sustento da minha família mesmo.
Júlio César Guimarães/UOL
Livro escrito pelo gari Haroldo César, 51, do Rio de Janeiro

UOL: Qual a postura da população em relação à limpeza urbana da cidade?
Haroldo:
É uma cidade que vive um contraste, de uma equipe de limpeza urbana, uma empresa muito eficiente e rápida, com uma população muito pouco consciente da importância de manter a cidade limpa. É uma contradição. O morador quer manter suas casas limpas, mas a rua, que é de todos, ele não se importa. É uma incoerência. Tem ruas secundárias no subúrbio, por exemplo, que as pessoas insistem em jogar entulho. E tem um projeto na Comlurb que recolhe o entulho de dentro da casa da pessoa de graça, que é o Remoção Gratuita. Mas só que tem algumas normas, como colocar o lixo em sacos pequenos, para que o gari possa levantá-lo e jogar no caminhão. Mas as pessoas não querem saber, querem se livrar do entulho que está dentro de casa de qualquer jeito. Aí, jogam para outra parte, que é também dele, que é a rua. Como está tudo sempre limpinho, eficiente, ninguém percebe o trabalho de gari. Aí, quando para um pouquinho, você rapidamente sente falta. Foi possível ver isso muito bem durante a greve.
UOL: O que achou da greve?
Haroldo:
Essa greve foi peculiar. Porque tiveram outros períodos em que ficamos recebendo só a inflação, um salário baixíssimo e nunca tinha acontecido esta força e adesão à greve. Acredito que as manifestações que aconteceram em 2013, que mobilizaram muitas pessoas no Rio e no Brasil, foram fonte de inspiração da greve. Essa rapaziada que fez mesmo a greve, que segurou, eles nem eram do sindicato, eles fizeram uma greve na marra, sem base legal, mas ainda assim conduziram a greve, conseguiram, e a gente tem que bater palma. Saíram vitoriosos. Não quer dizer que todo ano vai fazer isso, não é por aí, mas acho que, de uma forma ou de outra, eles conseguiram mostrar para o prefeito a importância do trabalho do gari. E temos que ter melhores salários mesmo.
UOL: Você cita os protestos de 2013 como fonte de inspiração para a greve. Qual a importância, em sua opinião, das manifestações populares?
Haroldo:
Acompanhei as manifestações do ano passado. Acho que toda a mobilização é válida e foram movimentos que também se mostraram vitoriosos. Os protestos mostraram a força que as pessoas têm quando estão todas juntas. Porque se a gente deixar, as autoridades fazem o que querem. Aumentam aqui, tiram dali, porque acreditam que ninguém vai notar, ligar, se manifestar. Mas quando as pessoas começam a se mobilizar, eles já começam a dar um passo atrás. O povo tem que acordar e quanto maiores e mais pacíficas forem, melhores. O ruim é o quebra quebra. E você viu que a passagem não aumentou e todo mundo sobreviveu, o governo, as empresas... Então, talvez, não tivesse necessidade daquele aumento. E acho que isso inspirou essa rapaziada que segurou a greve. Quando está todo mundo junto, não tem como.
UOL: Quais as maiores dificuldades da cidade atualmente?
Haroldo:
Como gari, para mim, o problema mais sério que tenho contato e está precisando de uma solução é a questão dos moradores de rua. Até para a questão da limpeza urbana mesmo da cidade. Muitas vezes há uma grande dificuldade, é preciso mover um aparato grande de viaturas, tempo, dinheiro para remover as pessoas de certas localidades e estas pessoas são encaminhados para o abrigo, mas logo saem e voltam para as ruas. Você está trabalhando com pessoas. Quando você trabalha com lixo, você vai lá, tira e não tem mais. Com as pessoas, não é assim. Nós precisamos achar a solução para inseri-los em uma vida social normalmente.

Gari Renato Sorriso declara apoio a colegas grevistas

UOL: E o preconceito com os garis, ainda existe?
Haroldo:
Sim, existe. O preconceito no caso contra o gari é justamente porque ele é visto como o homem da sujeira, quando, na verdade, ele é o homem da limpeza. E acho que um dos pontos que ajuda a combater o preconceito é justamente o salário. Porque o preconceito em cima do gari é muito pela associação com o subemprego, a pobreza. Antigamente o salário era mesmo muito ruim. Hoje em dia não. A gente ganha a mesma coisa que muitos outros profissionais. E isso mostra que é uma profissão mais valorizada. A motivação da minha geração para entrar na Comlurb já foi outra, de melhorar de vida, de subir dentro da empresa. O preconceito mudou, melhorou bastante. O perfil do gari e da Comlurb mudaram muito para melhor ao longo dos últimos 30 anos. Estou há 29 anos [na empresa] e vi muita coisa mudar. Mas o que não acontece é a gente não limpar. Jamais deixamos de limpar.