quinta-feira, 29 de maio de 2014

Contra o Genocídio da População Negra: Subsídios Técnicos e Teóricos para Psicologia

Nos últimos anos houve um aumento significativo da violência contra a população negra no Brasil. Segundo pesquisa realizada pelo IPEA e pelo dossiê realizado pelo Comitê Contra o Genocídio da Juventude Preta, Pobre e Periférica da cidade de São Paulo, os dados que relacionam mortes por assassinato à faixa etária e raça são alarmantes:

- Há uma projeção de que 32 mil adolescentes serão mortos violentamente entre 2007 e o final de 2013. A possibilidade de um adolescente negro ser vítima de violência é 3,7 vezes maior em comparação com os brancos;
- Em 2011, o número de mortes por autos de resistência apenas no Rio e em São Paulo foi 42,16% maior do que todas as execuções promovidas por 20 países em que há pena de morte!
- Em São Paulo, só em 2012, 546 pessoas foram mortas em decorrência de confronto com a Polícia Militar;
- A cada três assassinatos no País, dois vitimam negros;
- A possibilidade de o negro ser vítima de homicídio no Brasil é maior inclusive em grupos com escolaridade e características socioeconômicas semelhantes.
- A chance de um adolescente negro ser assassinado é 3,7 vezes maior em comparação com os brancos.
- Assassinatos atingem negros numa proporção 135% maior do que os não-negros;

Diante dessa conjuntura, várias entidades, grupos e setores organizados em torno da luta antirracista vêm se organizando nos últimos anos para denunciar, discutir e propor estratégias de enfrentamento à essa situação.

Somando-se a esses esforços, o CRP SP convida para o debate Contra o genocídio da população negra: subsídios teóricos e técnicos para a psicologia, no intuito de refletir como os psicólogos que atuam nas mais diversas áreas e instituições que lidam direta ou indiretamente com esse problema podem ampliar seus referenciais de atuação no enfrentamento dessa questão. Participaram ativistas do movimento negro, psicólogos e estudiosos da temática.

O evento terá transmissão online, via CRP WEB TV. Acesse:
www.crpsp.org.br/aovivo
Informações:
Departamento de Eventos do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo - CRP 06
Tel.: 11 - 3061.9494, ramais 334, 336, 337, 355, 356 e 357
E-mail:
eventos02@crpsp.org.br

Estacionamento: Car Park
Rua Cardeal Arcoverde, 201, Jardim América, São Paulo, SP
Para obter o desconto, retire o selo na recepção do CRP SP.

Audiência no Senado com Domenico de Masi

Messias Franca de Macedo
[P/ os vira-latas colonizados!]

O FUTURO DO BRASIL CHEGOU, DIZ DOMENICO DE MASI
Para o autor do recente livro ‘O futuro chegou’, que participou nesta terça-feira 27 de audiência pública no Senado, o momento do Brasil é este; segundo o sociólogo italiano, o País pode oferecer a um “mundo desorientado” um novo e pouco conhecido modelo de vida
27 DE MAIO DE 2014 ÀS 17:44
Marcos Magalhães, da Agência Senado – Nem o clima tenso que antecede a Copa do Mundo nem a perspectiva de reedição de grandes manifestações populares conseguem obscurecer o otimismo do sociólogo italiano Domenico de Masi. Para o autor do recente livro O futuro chegou, que participou nesta terça-feira (27) de audiência pública no Senado, o momento do Brasil é este. E o país pode oferecer a um “mundo desorientado” um novo e pouco conhecido modelo de vida.
Ainda em 1930, recordou o sociólogo, foi dito pela primeira vez, pela voz de um personagem do livro País do carnaval, de Jorge Amado, que o Brasil seria o país do futuro. Uma década depois, prosseguiu, foi a vez de o autor austríaco Stefan Zweig usar a mesma expressão como título de um livro sobre as possibilidades do país. Agora, compara o intelectual italiano, o Brasil tem o sétimo maior Produto Interno Bruto (PIB) do planeta, conta com grandes intelectuais e possui dezenas de boas universidades.
- O futuro chegou. Este é o futuro – disse De Masi ao final da audiência pública, promovida conjuntamente pela Comissão Senado do Futuro e pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE).
Ele criticou a soberba europeia, que renega outras culturas, e elogiou o escritor Gilberto Freyre por ter dito que nunca gostaria de ser “completamente maduro, mas sim experimental e incompleto”. Em sua opinião, essa busca constante pelo conhecimento e pela sabedoria é uma das boas características do que chamou de modelo brasileiro. Entre as outras, ele citou a mestiçagem, em um mundo cheio de conflitos raciais, e a contemplação da beleza.
Para o sociólogo, o arquiteto Oscar Niemeyer definiu o espírito brasileiro ao contestar o racionalismo do arquiteto suíço Le Corbusier, que havia feito a defesa da linha reta. “O que me atrai”, respondeu Nimemeyer, citado por De Masi, “é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida”.
– O Brasil nunca fez uma guerra contra seus vizinhos, com exceção da Guerra do Paraguai. E enquanto nós fazíamos guerras na Europa, o que faziam os índios no Brasil? Faziam arte, pintando o corpo da mulher amada – comparou Domenico de Masi.
Coragem
Provocado pelo senador Cristovam Buarque (PDT-DF), que promoveu um diálogo com o convidado durante a reunião, presidida pelo senador Cyro Miranda (PSDB-GO), o sociólogo criticou os intelectuais, por não formularem um novo modelo de referência para as sociedades em um período pós-industrial. Em sua opinião, os intelectuais perderam a coragem e não se arriscam a estabelecer novos paradigmas. Ele criticou inclusive os intelectuais brasileiros, que classificou de muito pessimistas.
A senadora Ana Amélia (PP-RS) citou o economista francês Thomas Piketty, autor do livro O capital no século 21, para perguntar ao italiano se concordava com a conclusão de Piketty, de que a renda está cada vez mais concentrada no planeta. O sociólogo concordou em que a concentração de renda vem aumentando dentro de cada país. Ele observou, porém, que os países ricos estão ficando menos ricos, e os pobres, menos pobres.
A senadora Ana Rita (PT-ES) e o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) lembraram as diversas campanhas sindicais em defesa da redução da jornada de trabalho no Brasil, atualmente estabelecida em 44 horas semanais. De Masi inicialmente lembrou que há vários tipos diferentes de trabalho. Quanto ao trabalho criativo, exemplificou, o trabalho não para nunca, pois o intelectual precisa estar sempre atento ao mundo que o cerca. Como regra geral, ele defendeu jornadas semanais de 15 horas.
– O trabalho é um vício, não uma virtude. Um vício imbuído pela religião, para compensar o pecado original. No paraíso não se trabalha – disse de Masi.
O sociólogo concordou com o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), para quem programas de renda básica deverão integrar o “futuro que está chegando”. Ele criticou ainda os ricos que não aceitam compartilhar sua riqueza com as parcelas mais pobres da sociedade.
– Conheci muitos ricos no Brasil que viviam cercados de seguranças. Perguntei a eles por que eles não pagavam impostos maiores, para que eles não precisassem de seguranças. Na Itália também existem ricos, mas os perigos são mínimos – comparou.
 
  • Mãe que perdeu filhos por serem negros virou referência na luta contra o racismo

    Zana Zaidan
  • Cleonice e Edna: a sogra é suporte para a nora depois que Isaías se foi e a deixou com 2 filhos (Foto: Zana Zaidan)Cleonice e Edna: a sogra é suporte para a nora depois que Isaías se foi e a deixou com 2 filhos (Foto: Zana Zaidan)
    Aos 51 anos, Cleonice Rocha da Silva pode dizer que sofreu mais do que muitas mães sofrem por uma vida inteira. Ainda assim, ela se mantém forte para atuar como referência contra a intolerância racial, depois de ter dois filhos assassinados por serem negros.
     
    No último dia 15, Isaías da Silva Faria, 30 anos foi baleado em uma conveniência no Jardim Colibri, em Campo Grande. Em 2007, o mesmo aconteceu com o filho caçula, Anderson da Silva Faria, 19 anos.
    “Meus filhos se foram e não voltam, mais. Mas se desde quando aconteceu com o Anderson eu tivesse começado a lutar, as coisas já poderiam ser diferentes. Agora, com o Isaías, me vejo na obrigação de mergulhar de cabeça contra o ódio e o preconceito”, afirma Cleonice.
    Isaías deixou a esposa, Edna Zeli Lessa, 20 anos, e dois filhos, de 5 e 3 anos. “Acabou com a nossa família. Os meninos eram muito ligados nele, perguntam o tempo todo pelo pai. Ainda estou aprendendo a lidar com a dor, mas minha sogra é o maior exemplo de força e me faz conseguir seguir em frente”, conta Edna, que estava junto há seis com Isaías.
    O inquérito policial ainda não foi concluído, mas testemunhas afirmaram que o suspeito do crime teria dito as palavras “Preto como você não sabe nem como usar banheiro”, antes de atirar contra Isaías.
    Vigilante noturno, ele tinha acabado de sair do trabalho e passou na conveniência antes de ir para casa. Embriagado, o suspeito estava insatisfeito com as condições do banheiro do lugar, e insistia que Isaías que resolvesse o problema. O homem chegou a sair da conveniência, mas voltou armado, efetuou três disparos (dois acertaram Isaías), e fugiu em seguida.
    Por ter motivação racista, caso deve chegar à promotora de Direitos Humanos do MPE (Foto: Marcos Ermínio)Por ter motivação racista, caso deve chegar à promotora de Direitos Humanos do MPE (Foto: Marcos Ermínio)
    O primeiro filho - O tio da então namorada de Anderson, conta Cleonice, não aceitava o relacionamento. “Ele tinha uma padaria e chegava a dizer que o lugar fedia quando meu filho estava lá, que um preto não era digno de casar com a sobrinha dele”.
    Quando o casamento foi marcado, Anderson resolveu ir até a padaria entrar em um consenso com o tio da namorada, mas os dois discutiram e um tiro de revólver atingiu o jovem. O crime aconteceu no dia 29 de dezembro de 2007, e depois de passar 16 dias internado, Anderson faleceu.
    “Mas a justiça foi feita. O culpado foi a júri popular, e condenado a 15 anos de prisão. Agora, só espero que o mesmo aconteça com quem matou outro filho meu”, diz dona Cleonice.
    Ela, que até então morava sozinha, passou a contar com a ajuda de uma das filhas e uma neta. A família é grande – são dois filhos homens, duas mulheres, nove netos e mais dois que estão a caminho.
    “Tenho muito medo que o mesmo possa acontecer com um deles. Somos todos negros, com muito orgulho, mas sei que o mundo lá fora pode ser muito cruel. Se eu pudesse, passaria o tempo todo com eles bem pertinho de mim. Mas não posso, então minha luta será pelo fim do preconceito”, resume a mãe.
     

    terça-feira, 13 de maio de 2014

    Até porque sinto um movimento conservador muito violento vindo por aí, um negócio esquisito. Um monte de jovem achando legal ostentar ‘sou politicamente incorreto, sim’, como se ser politicamente incorreto em si fosse revolucionário, moderno ou engraçado. E aí vira falta de civilização, de respeito, de gentileza, e daí pra falta de ética, preconceito e violência é um passo.”

    Wagner Moura

    De volta ao cinema nacional, o ator solta o verbo e alerta: 'sinto um movimento conservador muito violento vindo por aí'

     
    Olaf Heine

     

    Convidamos Adriana Falcão, autora de alguns dos textos de maior sucesso do teatro e da TV, para entrevistar Wagner Moura, que neste mês volta aos cinemas brasileiros com Praia do Futuro, filme de Karim Aïnouz. O relato passa pelos últimos 15 anos e tem de tudo: carreira, casamento, filhos, sucesso, engajamento político e estreia como diretor

    E aí Wagner Moura virou lenda.
    Mas eu prefiro começar a contar de antes, de quando eu comecei a acompanhar essa história.
    1999. Estava em Salvador e fui assistir a uma peça de teatro chamada Abismo de rosas. Não conhecia o autor, nem o diretor, nem o texto, nem sabia nada a respeito do espetáculo, portanto cheguei desavisada. Ignorava a existência do ator Wagner Moura, assim como a de todos os outros atores baianos que iria ver naquela noite. Quando o espetáculo começou, mais uma vez me dei conta de o quanto a gente ignora o que acontece fora do eixo Rio-São Paulo, por falta de informação, de interesse, de tempo ou de oportunidade, ou seja, por ignorância mesmo. O texto era lindo, a direção era chocante, o elenco era maravilhoso. Um ator atrevido, que representava misturando naturalidade com poesia, me chamou especialmente a atenção. Eu saí dali obcecada. “Quem é esse garoto, meu Deus?” “Wagner Moura. Um excelente ator baiano”, me explicaram. Ali, todo mundo sabia. E eu completamente abismada.
    Meses depois, um livro que escrevi, A máquina, ia ser adaptado e levado ao teatro por João Falcão, no Rio. Na concepção do diretor, o personagem principal seria vivido por quatro atores diferentes. O nome de Wagner apareceu na hora. O espetáculo estreou, foi um sucesso, os atores estouraram, alegria completa.
     
    “Sinto um movimento conservador muito violento vindo por aí, um negócio esquisito. Um monte de jovem achando legal ostentar ‘sou politicamente incorreto, sim’”
     
    Mas agora eu vou voltar outra vez para contar lá do começo da história.
    1976. Salvador, Bahia, Brasil. Nasce um menino, que é batizado de Wagner, numa família muito especial, que ia marcar o caráter do recém-nascido para o resto da sua vida. A família foi morar em Rodelas, uma cidade que foi alagada e reconstruída. O menino viveu a experiência de um dia sair de sua casa e ir morar numa outra casa igual a sua casa, numa cidade igual a sua outra cidade, que então já estava debaixo d’água. Foi marcante. Vez por outra, até hoje, ele tem desejo de contar isso, de uma forma ou de outra.
    Na década de 80, seu José, pai de Wagner, foi transferido para outras cidades do Brasil, e a família morou em diversos lugares. Dá para perceber, pelas ideias de Wagner, a riqueza de ter conhecido diferentes realidades brasileiras, assim como é evidente a importância do caráter de seu José na sua formação. Ele e o pai tiveram uma relação muito forte, bonita e importante enquanto seu José viveu. E, se hoje Wagner Moura é um excelente pai de seus três meninos, que estão com 7, 3, e 1 ano de idade, provavelmente seu José tem tudo a ver com isso.
    Mas deixa eu voltar para trás na história de novo.
    Quando a família voltou a morar em Salvador, Wagner se interessou por teatro. Fez parte de alguns grupos, exibiu algumas peças, mas acabou se formando em jornalismo.
    Acontece que aquele negócio de ser ator não queria deixar o moço em paz, e não deixou mesmo.
    Chegamos de volta a 2000.
    Depois do sucesso em A máquina, Wagner se mudou para o Rio de Janeiro e virou o ator mais cobiçado por diretores de teatro, cinema e TV do Brasil e, depois, do exterior. Nesses últimos 15 anos, seu currículo é tão grande que só consultando a Wikipédia. Como não daria para falar de tudo, ou esta matéria não caberia em seu espaço na revista, lá vai um resumo. 
    2001. No cinema, Abril despedaçado, de Walter Salles.
    2002. Atuou em As três Marias, de Aluizio Abranches, no cinema. No teatro, em Os solitários, com direção de Felipe Hirsch.
    2003. Foram quatro filmes: O caminho das nuvens, de Vicente Amorim, O homem do ano, de José Henrique Fonseca, Carandiru, de Hector Babenco, e Deus é brasileiro, de Carlos Diegues. Enquanto isso, usava e abusava do lado comediante no seriado Sexo frágil, dirigido por João Falcão e Flávia Lacerda.
    2004. Participou de mais um filme, Nina, de Heitor Dhalia.
    2005. Um ano diversificado. Atuou em Cidade Baixa, de Sérgio Machado, que teve roteiro de Karim Aïnouz. O que diz Molero, de Aderbal Filho, no teatro. E na novela A lua me disse, na televisão.
    2006. Viveu o personagem título da série JK, de Dennis Carvalho.
    2007. Outro ano cinematográfico: Tropa de elite, de José Padilha, Saneamento básico, de Jorge Furtado e Ó Paí, ó, de Monique Gardenberg.
    2008. No cinema, protagonizou Romance, de Guel Arraes, e ainda fez nada mais do que Hamlet, no teatro, com direção de Aderbal Filho.
    2009. Tropa de elite 2, de José Padilha.
    2010. VIPs, de Toniko Melo.
    2011. O homem do futuro, de Cláudio Torres.
    2012. A busca, de Luciano Moura.
    2013. Serra Pelada, de Heitor Dhalia, e Elysium, de Neil Blomkamp.
    Seu mais recente trabalho é o novo filme de Karim Aïnouz, Praia do Futuro. A trama se passa entre Berlim e o Ceará – na praia que dá título ao filme. Wagner vive Donato, um salva-vidas que está em paz com suas escolhas, até que falha, e sua vida vira pelo avesso. Donato tem muita proximidade com o irmão mais novo, que o vê como pai, mais que isso, como herói. Ele parece feliz com sua vida e seu trabalho, até o dia em que tenta salvar um homem que está se afogando, e não consegue. O homem morre afogado. O salva-vidas entra em crise. Aparece o amigo do morto, Konrad, um alemão que está por ali a passeio. Logo após os procedimentos de praxe entre um salva-vidas e o representante da vítima, Konrad e Donato começam a viver um romance. Quando Konrad volta para Berlim, Donato vai com ele, deixando o irmão mais novo, e todo o seu passado, lá na Praia do Futuro. O tempo anda, junto com a história, e um dia o seu irmão, já crescido, chega a Berlim, inconformado com o fato de ter sido abandonado. E aí está a importância desse filme, para Wagner.
    Muito ainda vai se falar por aí a respeito da ousadia das cenas de sexo entre Donato/Wagner Moura e Clemens Schick, ator que interpreta Konrad, a respeito da homossexualidade, das cenas de nudez etc. Mas Wagner parece não prestar a menor atenção a isso, e fala: “Eu sempre quis trabalhar de novo com o Karim e me comovi com o roteiro que, para mim, é uma história sobre abandono. Na primeira leitura, me perguntei, e perguntei a Karim, por que Donato abandona o irmão, e toda sua vida, para ir morar em Berlim. Até descobrir que isso não tem explicação, nem para mim, nem para o Donato. Acontece disso na vida. E eu acho isso sofisticado. Donato não sabe dizer o que o levou. Na hora que ele deixou o cara morrer, o herói quebrou, apareceu o Konrad na vida dele e Donato se tornou mais humano. E então foi indo, foi, quando viu já estava lá havia muito tempo, e essa falta de explicação é algo muito complexo nesse filme”.
    2014. E aí Wagner Moura virou lenda.
    Hoje, absolutamente consagrado, o que mais ele poderia querer da vida? Muito.
    No campo profissional, está empolgadíssimo com seu próximo projeto: dirigir um longa-metragem sobre Carlos Marighella, roteiro que está escrevendo em parceria com Felipe Braga.
    O interesse pelo tema vem de algo mais profundo.
    Faz parte da personalidade de Wagner estar atento às questões políticas, econômicas e sociais. Suas posições são firmes e, de certa forma, conduzem sua carreira. Só o fato de ser baiano já sugere uma postura de Wagner em relação a qualquer tipo de preconceito. Enquanto está na moda questionar uma suposta “mesmice” ou exagero do “politicamente correto”, ele se declara politicamente correto, com orgulho. E explica por quê. “A gente tem que ter alguma referência do que é bacana. Não sou bobo para chegar ao ponto de me referir a um anão como ‘uma pessoa de estatura desavantajada’, mas brigo muito pelo respeito entre seres humanos. Até porque sinto um movimento conservador muito violento vindo por aí, um negócio esquisito. Um monte de jovem achando legal ostentar ‘sou politicamente incorreto, sim’, como se ser politicamente incorreto em si fosse revolucionário, moderno ou engraçado. E aí vira falta de civilização, de respeito, de gentileza, e daí pra falta de ética, preconceito e violência é um passo.”
     
    “Hoje, o que eu vejo é o individualismo se espalhando e o coletivo se perdendo. Tudo mudou muito”
     
    Sua empolgação com o projeto de Marighela vai além de se tornar um diretor e contar uma boa história. Wagner explica: “Tudo que a gente faz, com o tempo descobre que fez aquilo para entender alguma coisa. O acontecimento da ditadura militar, e a posição das pessoas que lutaram contra o regime opressor e pela liberdade, lá nas décadas de 60 e 70, foi algo que a minha geração não viveu. Portanto a gente mal faz ideia do que aquelas pessoas pensavam, de como eram aqueles conflitos. Quero fugir do maniqueísmo, mas algumas coisas, como viver na clandestinidade, não ter trabalho, o exílio, a tortura, e tudo mais, foram fato mesmo. A história vale ser registrada. Aquelas pessoas, lá atrás, que estavam contra o regime, acreditavam que pela força coletiva dava pra mudar o mundo. Uma coisa um pouco ingênua também, mas tão linda. Hoje, o que eu vejo é o individualismo se espalhando, e o coletivo se perdendo. Tudo mudou muito. E eu quero que o meu filme sobre o Marighella seja uma coisa do olhar da minha geração sobre aquela”.
    Que venha Marighella!
    No campo pessoal, Wagner não poderia estar mais feliz. Casado com a fotógrafa Sandra Delgado há 13 anos, vive uma vida familiar amorosa e sossegada. Wagner é completamente apaixonado por seus três meninos.
    Nunca vou esquecer do dia em que recebi um e-mail cujo assunto era “Nasceu Bem”. Eu fiquei toda alegre, “o filho de Sandra e Wagner nasceu bem!”. Quando abri a mensagem, descobri que “Bem” era o nome da criança. Os outros dois se chamam Salvador e José. Mais a cara de Wagner, impossível.
    *Adriana Falcão é escritora e roteirista da TV Globo e já esteve nas Páginas Vermelhas da Tpm em março de 2009.

    Discutindo os venenos

    Está prometida para 2015 mais uma parceria de Wagner Moura e José Padilha – a dupla principal do megassucesso Tropa de elite1 e 2. E mais uma vez a história é ligada às drogas. Narco, série da Netflix (canal na internet que já lançou hits como House of Cards, com Kevin Spacey), terá Padilha como diretor e Wagner no papel do traficante Pablo Escobar, mostrando a história do Cartel de Medellín, na Colômbia. “Nossa ideia é contar como a cocaína se tornou um grande problema para os Estados Unidos e a Europa, e como tudo começou em Medellín”, diz o diretor. Wagner já falou à Tpm e à Trip sobre a questão em abril de 2010, época do lançamento de Tropa de elite 2. Em uma declaração, defendeu a legalização para que as drogas deixem de ser um problema de segurança pública e passem a ser uma questão de saúde pública. “A legalização das drogas está ligada ao conceito de bem-estar social promovido pelo governo, porque é uma forma de você quebrar o tráfico sem tanto tiro”, disse o ator, que falou também sobre o consumo de drogas ser um fato no mundo inteiro – contra o qual parece inútil brigar. “Conheço pessoas que convivem com isso normalmente, que fumam maconha há muito tempo e estão trabalhando, felizes. E tem também as que têm problema químico com a história, e aí vira uma tragédia.”
    Vai lá: http://goo.gl/1k04tC (Páginas Vermelhas da Tpm com Wagner) e http://goo.gl/eKKIVB (Páginas Negras, da Trip).
     
     
     
    13/05/2014 10:08

    Os 5 trabalhos mais miseráveis do mundo

     
    Portal Forum/J.E
     
    “Uma das coisas mais tristes é que a única coisa que um homem pode fazer durante oito horas, dia após dia, é trabalhar. Não se pode comer durante oito horas, nem beber oito horas, nem fazer amor oito horas… A única coisa que se pode fazer durante oito horas é trabalhar. E esse é o motivo pelo qual o homem se torna tão desgraçado e infeliz a si mesmo e os demais”, dizia o escritor norte-americano William Faulkner.
    É com essa reflexão que começa “Workingman’s Death” (A Morte do Operário) -, um impressionante documentário que percorre metade do mundo para denunciar a existência de trabalhos miseráveis que, na sua face mais desumana, praticamente desapareceram dos países ricos.
    O diretor do documentário, o austríaco Michael Glawogger, segue as “mulas humanas” do vulcão Kawah Ijen (Indonésia), os trabalhadores do matadouro do mercado de carne de Port Harcourt (Nigéria), os desmontadores de petroleiros de Gaddani (Paquistão), os operários metalúrgicos chineses e mineiros clandestinos ucranianos para denunciar que os trabalhos mais miseráveis não desapareceram do planeta, apenas se tornaram invisíveis para os olhos dos cidadãos dos países industrializados.
    “O trabalho pode ser muitas coisas. Com frequência mal é visível. Às vezes é difícil de explicar. E, em muitos casos, impossível de retratar. Mas o duro trabalho manual é visível, explicável e retratável. É por isso que com frequência penso que é o único trabalho real”, opina Glawogger, que ganhou o Prêmio Especial do Júri no Festival de Cinema de Gijón (Espanha) por Workingman’s Death.
    Conheça as atividades denunciadas no documentário. Longe de acabar, elas continuam a degradar a condição humana:

    1. “Mula humana” no vulcão

    Todos os dias, por umas míseras moedas, dezenas de homens sobem ao vulcão indonésio Kawah Ijen para, asfixiados por fumaças tóxicas, arrancar enormes blocos de enxofre das suas entranhas. Sobem ao vulcão entre cantos e tosses, mas descem carregados como mulas, com mais de 100 quilos de mineral deformando às suas costas. Numa cena do filme “Workingman’s Death”, um mineiro, possivelmente a brincar, conta a outro como beijou uma mulher francesa que tinha acabado de conhecer. “Eu estava com o nariz sujo por causa dos vapores do enxofre, mas ela deixou-me beijá-la. Foi muito bom.” É cada vez maior o número de turistas que vêm ao vulcão para tirar fotos ao lado das “mulas humanas”.

    2. Trabalhador do matadouro numa cidade petroleira

    O nigeriano Isaac Mohammed levanta-se todos os dias às cinco da manhã para ir ao matadouro da sua cidade degolar cabras e vacas. Trabalha no mercado de carne de Port Harcourt, uma cidade do delta do rio Níger na qual convivem a pobreza extrema com a ostentação das petroleiras ocidentais, como a Shell. Durante a sua jornada, os trabalhadores do matadouro arrastam pesadas cabeças de vaca pela lama para leva-las até à fogueira, onde são cozidas para venda. E, no final do dia, se não levaram uma chifrada de um bovino, muitos completam o seu miserável salário com outros trabalhos, como conduzir um táxi-moto.

    3. Desmontadores de navios petroleiros

    Muitos pashtuns (etnia) são pobres. Por isso acabam por procurar ganhar a vida em lugares como Gaddani, um porto no Paquistão convertido em cemitério de barcos gigantescos. Em Gaddani, milhares de trabalhadores desmontam cargueiros e petroleiros para convertê-los em placas de aço. “Um passo em falso e é uma queda de 80 metros. Ou cai um pedaço de aço na cabeça. Ou o óleo e os gases residuais te incendeiam. Temos a morte sempre presente”, explica um trabalhador em “Workingman’s Death”. Eles trabalham durante um ano e depois, com sorte, poderão voltar durante um mês a casa. “O pagamento nunca foi suficiente, nem antes nem agora”, lamenta um homem que trabalha na área desde 1991. “Alá nos encomendou esta tarefa”, proclama outro.

    4. Metalúrgico na China

    A província de Liaoning, no nordeste da China, acolhe algumas das maiores fornalhas do país e do mundo. Enquanto a Alemanha converte algumas das suas antigas fundições em parques temáticos para crianças, como fez a cidade de Duisburg com as suas gigantescas siderúrgicas em 1985, a China faz o movimento contrário e expande suas fornalhas para fornecer ferro e aço ao mundo. Nas fundições, os operários chineses trabalham de sol a sol em condições penosas, como faziam os empregados de Duisburg há mais de meio século.

    5. Mineiro na “ratoeira” nevada

    “Temos sempre medo. Um desmoronamento de 10 centímetros e é o fim. Não há forma de nos tirarem daqui”, confessa um mineiro ilegal ucraniano no filme de Michael Glawoggfer. Junto com outros companheiros da bacia de Donbass (região ucraniana), procura carvão em filões aos quais os seus avós chamavam “ratoeiras”. Fora da mina, as mulheres carregam o carvão no meio da neve, até duas toneladas por dia cada uma. Em frente à câmara, os mineiros gozam com Aleksei Stajanov, o famoso mineiro transformado em ídolo pela propaganda soviética em 1935, depois de extrair mais de cem toneladas de carvão numa só jornada. “Nós não somos movidos pelo entusiasmo. Aquilo foi uma palhaçada.