sábado, 26 de setembro de 2015

 

 Put money in my hand
And I will do the things you want me to
Vanity overriding wisdom
Usually common sense
Should I delete it
You said you'd read it
You promised you would
Never ruin it with sequels
I wake for you on and on

Beyond all ideas of right
And wrong there is a field
I will be meeting you there
The moon's a skull
I think it's grinning
The room is full of people
Now I think it's spinning

Wanted you
Didn't ask for nothing
Wait for you on and on
And I don't need your tie
I don't need to, tired of saying it
We don't need more talk
Don't empty out your canteen
On the desert floor
Ahh, it's all my fault

Never wanna spell it out
I just want to say
That it is all my fault
I could never spit it out
I don't wanna fix your tie
Never want to say we're sad
Thankful that we got some chance
I know you won't get back your time
I wish that you could take it back
Beyond all ideas of right and wrong
There is a field
I will be meeting you there

He wanted it more than me, I suppose
I was in a rush to wait in a line
Now I hear echoes of my old self
This is not the way to be
All at once
I lost my way

Is it not true, the things that we did?
Come here at once and look what they did
Come here shut down and tune in tonite
Learn the words that they teach you
Without you realizing it
Come here sit down and watch some tv

Mine all mine wait your turn
Cross my cross slice his hand
Not your son not your friend not your enemy
I rely on the little things to get me by
Conscience says "I'm ok"
You don't hear what they say
"He's not my son, search his home"
Off to war
It's time to go hide inside

Soft skin
Weak chin
Just walk me thru it, tell me what to do I'll do
Hurry hurry, that's my baby
Ohh, do what you can
All the time - he waits for me
And now we talk from time to time
Hits you on the head when nobody's there
Then he says "come here could you fix my tie? "

It's never gonna be
To be is not the way to be
Show me where to go
Don't get angry so quickly
Fuck depression
Beyond all ideas of right and wrong there is a field
I will be meeting you there

Understanding is more important than love
If not money will always trump justice
All is lost
I'll find my way
So I say
To be is not to be
To be is not the way to be


sexta-feira, 18 de setembro de 2015


Brasil e Canadá inovam em
pesquisas sobre saúde mental

Projeto rendeu debates, 40 teses, site, 54 artigos nacionais e internacionais, além de oito capítulos de livros

·       Texto: 


Especial para o JU

·       Fotos: 


·       Edição de Imagens: 





Durante cinco anos, pesquisadores, estudantes, usuários e prestadores de serviços da Unicamp e da Universidade de Montreal investigaram modelos de saúde mental no Brasil e no Canadá. O projeto foi financiado pela Aliança de Pesquisa Comunidade-Universidade (ARUC) do Canadá e buscou influenciar debates acadêmicos e políticos em favor da luta contra o estigma das doenças mentais, aproximar os serviços de saúde, a comunidade e a pesquisa acadêmica.

As abordagens de investigação tomaram, como base, metodologias participativas e inclusivas de alunos de mestrado, doutorado e pós-doutorandos e gerou 40 teses, 54 publicações nacionais e internacionais, oito capítulos de livros, o site www.aruci-smc.org, dentre outros produtos oriundos do projeto. A participação ativa dos usuários no processo de investigação tornou-se um evento sem precedentes no Brasil.

“A quantidade de alunos envolvidos no projeto foi enorme. Só de doutorado e pós-doutorado do Brasil foram 35 alunos. O que me encantou no projeto foi fazer ciência aplicável engajada com a comunidade. Essa é uma tendência mundial de pesquisa participativa inclusiva, que no Brasil tem pouco desenvolvimento. Temos, por exemplo, um artigo recém-publicado nos Cadernos HumanizaSUS, publicado pelo Ministério da Saúde, que foi escrito com a participação dos próprios usuários dos serviços da saúde mental”, revelou Rosana Teresa Onocko-Campos, médica do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp e coordenadora do projeto ARUC.

O artigo “A experiência de produção de saber no encontro entre pesquisadores e usuários de serviços públicos de saúde mental: A construção do guia GAM” reuniu 27 autores entre docentes, mestrandos e doutorandos da Unicamp, da Universidade Federal Fluminense e Universidade Federal do Rio Grande do Sul e também usuários de serviço de saúde mental dos municípios de Campinas (SP), Novo Hamburgo e São Leopoldo (RS), Rio de Janeiro e São Pedro da Aldeia (RJ), e trabalhadores desses serviços. Segundo Onocko-Campos, o artigo levou dois anos para ser escrito.

No Brasil, até a década de 1980, os hospitais psiquiátricos e os asilos eram os principais locais de tratamento para pessoas com problemas mentais graves. A Reforma Psiquiátrica instituiu uma nova política de saúde mental, que teve, como um de seus principais recursos, o desenvolvimento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) para o tratamento em saúde mental na comunidade, possibilitando o seguimento ambulatorial e a atenção à crise. 

Reconhecendo o contexto de utilização pouco crítica dos medicamentos nos tratamentos em saúde mental, bem como o valor simbólico da medicação para aqueles que a utilizam, foi desenvolvida em Quebec, no Canadá, o guia de Gestão Autônoma da Medicação (GAM), para que os usuários tivessem acesso a informações sobre seus tratamentos e pudessem reivindicar seus direitos e até mesmo a retirada da medicação.

Description: A médica Rosana Teresa Onocko-Campos, coordenadora do projeto ARUC: “A direção proposta é a de que o usuário, em vez de ocupar um lugar de dependência na relação com o serviço, tenha o serviço como espaço a partir do qual retome o seu lugar de cidadão”A versão brasileira não manteve o tema da retirada da medicação, mas reforçou a tomada de decisões compartilhadas entre usuário e profissional de saúde. O guia é dividido em passos, onde a pessoa é convidada a fazer um balanço da própria vida para alcançar uma melhor qualidade de saúde.

“O guia GAM revelou que o uso dos medicamentos aumenta o poder dos serviços de saúde mental, coisa que outras pesquisas avaliativas não haviam conseguido mostrar. A medicação psiquiátrica ainda é usada como forma de controle das pessoas. O grande paradoxo é que descobrimos que a palavra do usuário é pouco ouvida na hora da prescrição da medicação nos serviços comunitários de saúde mental”, disse Onocko-Campos.

A pesquisadora da FCM afirma que algumas pessoas têm comparado a medicação psiquiátrica a remédios para hipertensão ou diabetes, como algo que deve ser tomado a vida inteira. A diferença, alega, está na dosagem. Por meio de um exame de sangue é possível ao médico prescrever qual a dose certa para o controle da hipertensão ou diabetes. Já para os medicamentos que afetam percepções e sensações, como os ansiolíticos, não há como ter essa dosagem por meio de exames de laboratório.

“Se eu lhe dou um regulador de humor, como vou saber como está o seu humor se não for confiando no que você me disse? Há pessoas que estão tomando há anos medicamentos sem saber dos efeitos colaterais. Queremos trazer a experiência do usuário para a tomada de decisão quanto a uma boa prescrição”, revelou Onocko-Campos.

A pesquisa, com aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp, respeitou os aspectos éticos e legais implicados no trabalho com pessoas, sobretudo usuárias da rede de saúde mental. Os usuários da intervenção GAM referiam-se ao grupo como um local para troca de um “saber experiencial” sobre o medicamento, no qual cada um pôde contar sua vivência singular com relação ao uso dos psicotrópicos.

Nas narrativas dos usuários, os CAPS foram descritos ora como lugar de tratamento e cuidado positivamente avaliado, como fomentador de espaço de escuta, de troca e produção de trabalho, ora como promotor de sentimentos de baixo poder de troca e de participação. Foram identificados vários problemas associados à dificuldade de comunicação sobre esse tema: relações desiguais de poder, coerção, medo, timidez, uso de linguagem técnica, ausência de escuta para a vivência pessoal e atribuição exclusiva de competências. Percebeu-se a existência de um limite tênue entre o cuidado com a saúde dos usuários e a tendência ao gerenciamento absoluto de suas vidas. 

As pesquisas levaram à constatação de que ainda são necessárias mudanças nas práticas em saúde mental, especialmente no que se refere à valorização da experiência do usuário em seu tratamento.

“Nesses cinco anos de pesquisa, o que nos chamou a atenção foi o aspecto da prescrição de medicamento tanto dentro da reforma psiquiátrica quanto nos serviços comunitários, nos quais é feito de forma tradicional, com pouco diálogo com os pacientes, muita verticalidade e assimetria na tomada de decisão entre médicos e pacientes. A direção proposta é a de que o usuário, em vez de ocupar um lugar de dependência na relação com o serviço, tenha o serviço como espaço a partir do qual retome o seu lugar de cidadão. Isso foi uma diferença que apareceu nos estudos comparados entre o Canadá e o Brasil”, revelou Onocko.

As pesquisas mostraram que a verticalidade do saber médico sobre o usuário apareceu tanto no Brasil quanto no Canadá, mas o que torna os usuários brasileiros mais frágeis, sobretudo os pacientes atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), é a baixa escolaridade, o escasso poder aquisitivo, o acesso à boa alimentação, a baixa qualidade da moradia e outros fatores, se comparados ao nível de vida dos usuários canadenses.

“Como se não bastasse o estigma da doença mental, que gera uma certa segregação social, a diferença cultural torna os usuários mais fragilizados. Precisamos criar canais de comunicação para que os médicos mediquem corretamente do ponto de vista farmacológico, quando necessário, mas com um grau de permeabilidade com o que os pacientes sentem e acham”, reforçou Onocko-Campos.

O projeto como um todo teve um sistema de governança muito particular, pois permitiu inserir os alunos de pós-graduação em grandes grupos de pesquisa e mudar conceitos. Depoimentos de alunos do Canadá e do Brasil mostram que, depois de participarem do projeto ARUC, eles não conseguem fazer pesquisa sobre as pessoas sem pensar o que elas acham.

De acordo com Onocko-Campos, a FCM da Unicamp está entrando com outro pedido de financiamento no Canadá. A ideia é desdobrar o trabalho na apreensão do processo do adoecimento, mantendo a ênfase na inclusão do usuário nos estudos participativos, com maior refinamento e qualidade do ponto de vista científico.

“Às vezes, tendemos a achar que inovação só existe na área mais dura – engenharia, computação, matemática, física –, mas essa é uma pesquisa inovadora dentro da internacionalização. Por conta desse trabalho, estamos buscando novos convênios com a Universidade de Yale, nos Estados Unidos. E em setembro, vamos para Londres conversar com pesquisadores do Kingdom College, o grupo mais citado do mundo de avaliação de serviços mental. Hoje, as pesquisas são aglutinadas em rede. Essa é uma nova tendência da ciência contemporânea”, revelou Onocko-Campos.

 

Publicações

 

Artigo: A experiência de produção de saber no encontro entre pesquisadores e usuários de serviços públicos de saúde mental: A construção do guia GAM

Autores: Rosana Teresa Onocko Campos, Eduardo Passos, Analice de Lima Palombini et ali

Unidades: Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, Universidade Federal Fluminense, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Publicação: Cadernos HumanizaSUS, volume 5, Saúde mental, 2015

 

Artigo: Human rights and the use of psychiatric medication

Autores: Lourdes Rodriguez del Barrio, Rosana Teresa Onocko Campos, Sabrina Stefanello, Deivisson Vianna Dantas dos Santos, Ce´ line Cyr, Lisa Benisty e Thais de Carvalho Otanari

Unidades: Universidade de Campinas e Universidade de Montreal

Publicação: Journal of Public Mental Health, Vol. 13, nº. 4 2014, pp. 179-188

 

Artigo: A Gestão Autônoma da Medicação: uma intervenção analisadora de serviços em saúde mental

Autores: Rosana Teresa Onocko Campos, Eduardo Passos, Analice de Lima Palombini, Deivisson Vianna Dantas dos Santos, Sabrina Stefanello, Laura Lamas Martins Gonçalves, Paula Milward de Andrade e Luana Ribeiro Borges

Unidades: Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal Fluminense, Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Publicação: Ciência & Saúde Coletiva 18(10):2889-2898, 2013
 

Não deixe de Lutar - Júnior Dread e Gustavo Black Alien






 Sei que o tempo não vai voltar
O que já passou nem quero lembrar
Não to pra perder jogo pra ganhar
Nunca deixo de lutar
Eu digo então

Mas se for pra desistir eu prefiro morrer
Tem que errar pra poder aprender
Sua história sua memória
É a resposta dentro de vc
Quem só fala a vida vai cobrar
Se vc não acredita vai ter que pagar
Corre atrás quem precisa tem que acreditar
Nunca deixo de lutar

Tudo na vida de nada mais vale
Se não tem amor
Encontre a saída não importa o que falem
Seja como for

Éis ou não éis sagaz
Sagacidade no seu máximo é fundamental
Desde neanderthal o aproveitamento do físico e do mental
Que tal?
Uma vez que vc nasceu o presente que ele te dera não tem, ano que vem
Embrulhado debaixo de sua árvore de natal
Em concordata to na moral
Vou acordar seu coração com um afago ou um balde de gelo
Da água pro vinho de sonho a pesadelo
Gwan
O inferno na era glacial
E a gente cai no pêlo
Num dia bonito eu paro e analiso
Lucro e prejuízo comparo e o resultado é o juízo final



 Voa leve
Voa alto
Gira mundo
Roda gigante

Voa leve
Voa alto
Gira mundo

Quando você passar
Vou pegar em sua mão
Te abraçar
Você sabe quem te ama

Juntos voltaremos a girar
Juntos voltaremos a girar
Juntos voltaremos a girar
Juntos voltaremos a girar

Respirar você
Sair do chão
Perder o ar
Perto de você nuvem no céu

Respirar você
Perder o chão
Sair do ar
Perto de você nuvem no céu da boca





 
 [Refrão]
Ela tem cores, curvas, sabores
Coisas que seduzi e,
Eu levo flores, som de cantores
E ela ama ouvir
Se der minha hora preciso ir embora
Mas ela me impede
De um jeito louco, "fica um pouco"
Sou incapaz de ir.
Não vou mentir
Fiquei envolvidão

Ma-ma-malandro era inevitável eu não me envolver
Ela é inacreditável, você tinha que ver
Se liga essas pretinha, toda emperiquitadinha
Meio modeletizinha na pegada "france"
Tem a simplicidade que é difícil se ver
E a sagacidade que é difícil se ter
È de falar baixinho, gosta de calor, carinho
E quando vai tomar um vinho pra brindar de "santé"
A gente se combina, a gente tem tudo a ver
Se é coisa do destino eu já não sei te dizer
Havia conhecido através de um conhecido
Ela prima de um amigo que eu trombei num rolê, e

[Refrão]
Ela tem cores, curvas, sabores
Coisas que seduzi e,
Eu levo flores, som de cantores
E ela ama ouvir
Se der minha hora preciso ir embora
Mas ela me impede
De um jeito louco, fica um pouco
Sou incapaz de ir.
Não vou mentir
Fiquei envolvidão

E ela tinha uma mania de caçar assunto
Dizia que amor-ciúme era um conjunto
Pedia pra Eu valorizar as crise de ciúme dela
Porque se o ciúme dela sumisse o amor também sumia junto e
Curtia Nutella, revista, novela, sambista portela
A pista, favela, mó sinistra ela
Frasista e bela, lia Sérgio Vaz, era fã de Mandela
Vai pensando que ela é fácil. rapaz
Ela não é daquelas minas "tanto fez, tanto faz"
Não cabe naquela rima de alguns anos atrás
Nem combina com as mulheres vulgares
Uma noite e nada mais

[Refrão]
Ela tem cores, curvas, sabores
Coisas que seduzi e,
Eu levo flores, som de cantores
E ela ama ouvir
Se der minha hora preciso ir embora
Mas ela me impede
De um jeito louco, "fica um pouco"
Sou incapaz de ir.
Não vou mentir
Fiquei envolvidão.

E ela quer, quer, quer, quer, quer, quer
Eu fiquei envolvidão.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015


 Lembra dos retro-mutantes, dos proto-mutantes
Dos bio-mutantes cantados em momentos atrás
Os quais ainda são a linha esperada
A conduta marcada por atitudes de originalidade e paz

Mas desta vez vou falar de homens
Que por caminhos diferentes daqueles
Procuram também seus objetivos naturais
Também não se estabeleceram, não aceitaram
Não se encaixaram em perversas etiquetas sociais

Todos anormais, todos desqualificados
Castrados, desajustados, considerados um problema
Eles têm uma sensibilidade aflorada
Que os tolos não podem aceitar
Porque estão todos fora do esquema

Agora onde sou? Quem estou?
Pra quem só passa pela vida isso pode até parecer brincadeira
Mas não. Como eles, eu volto ao monte, volto à caverna
Sinto o bicho que sou se contorcendo em minha veia
Volto ao tudo para achar a resposta mais sensata
A carne dos Deuses em minha cara

Simplesmente
A carne dos Deuses em minha cara
Eu volto ao monte
A carne dos Deuses em minha cara

E assim eles me mostraram:
Passe dos limites da sua casa, da sua turma
Se comunique sem nenhum tipo de rótulo
Supere seus limites
Não se conforme com a informação
Busque, atreva, ultrapasse os muros impostos
Atravesse a linha do seu horizonte
Eleve seu espírito como um flash sem destino,
Em todas as direções
Supere seus limites de respiração, de força, de bicho
Como um macaco nu que luta incondicionalmente pela vida

Então, sinta mais
Abrace cada sentimento, seja ele qual for
Como se abraça a quem se ama
E quando precisar, chore
Onde estiver, chore
E um dia, dance... Um dia dance do jeito que você quiser
Sem dúvida as pessoas que dançam com verdade
São pessoas muito mais felizes
E por mais louco que possa parecer, não me ouça
Pois posso ser apenas mais um tijolo daquele muro que você quer
Passar
Simplesmente passar
Passar
Simplesmente passar

Simplesmente
A carne dos Deuses em minha cara
Eu volto ao monte
Eu volto ao monte

domingo, 13 de setembro de 2015


Pochmann vê risco de retrocesso 
na redução da desigualdade no país

Professor do Instituto de Economia lança livro que, sob uma perspectiva 
histórica, reúne dados sobre as diferenças de renda e riqueza entre os brasileiros


O economista e professor Marcio Pochmann: “Entendemos que há, neste ano de 2015, um fato novo, que é um ponto de inflexão na trajetória de redução da desigualdade”O economista, pesquisador e docente do Instituto de Economia (IE) da Unicamp Marcio Pochmann, ex-presidente do Ipea, vê em 2015 um risco de retrocesso na trajetória de redução da desigualdade que o Brasil traçou na primeira década do século 21. “Neste ano temos um fato novo, que é um ponto de inflexão na trajetória, que vem dos anos 2000, em relação à questão da desigualdade”, disse ele. “Nós possivelmente deveremos ter um retrocesso. Já estamos observando um aumento do desemprego e uma queda na massa de salários, diante inclusive dos lucros apresentados pelos bancos: deveremos ter talvez quase 10% do PIB transferido para o sistema bancário em função das altas taxas de juros. Esse quadro põe um ponto de interrogação numa trajetória de redução da desigualdade”.
Pochmann falou com o Jornal da Unicamp no lançamento de seu livro Desigualdade Econômica no Brasil, que reúne dados sobre as diferenças de renda e riqueza entre os brasileiros, as classes sociais, municípios e regiões do Brasil, incluindo-os numa perspectiva histórica. “Em primeiro lugar, é preciso entender que a desigualdade que temos hoje tem a ver com o passado. Um passado que se forjou a partir de um processo de exclusão gerado pela escravidão”, lembrou. 
“É uma desigualdade que tem passado, mas também tem presente, e que resulta, por exemplo, nas ineficiências do Estado brasileiro, da fortaleza do Estado em tributar os pobres e não tributar os ricos: essa é uma questão que resulta das opções que o Brasil tem feito”, afirmou. “Mas eu diria que, pelas experiências recentes que tivemos, que o Brasil pode acelerar o passo e avançar mais rapidamente para construir uma sociedade menos desigual do que a que temos atualmente”.
Leia, abaixo, os principais pontos da entrevista de Pochmann:

Jornal da Unicamp – Desigualdade é algo necessariamente ruim? É fácil compreender que a pobreza extrema e a miséria devem ser combatidas, mas por que enfocar a desigualdade?
Marcio Pochmann – Existe uma confusão, que muitas vezes acontece, entre desigualdade e diversidade. Diversidade, eu diria que, num país como o nosso, é um dos principais ativos que temos: uma riqueza que, no século 19, até no século 20, era vista como uma das razões do nosso atraso, por exemplo no caso da mistura de raças, essa diversidade que o Brasil gerou e que é conhecida no mundo todo. Então eu diria que a diversidade é um elemento positivo. 
Agora, quando se fala em desigualdade, pode-se medir a desigualdade de oportunidades, a desigualdade de resultados. Por exemplo, nós somos um país que se tornou república em 1889, e levou praticamente 100 anos para oferecer igualdade de acesso à educação básica. Nós não universalizamos a educação, sendo que a base da República, em qualquer país, é a universalização do acesso à educação. 
E, se hoje temos um acesso universalizado, a qualidade da educação ainda é uma coisa dramática. A educação, dessa forma, reproduz a desigualdade. É como se nós estivéssemos numa corrida de Fórmula 1. Há uma diversidade de marcas, de carros, de pilotos. O ambiente é diverso, mas não há desigualdade no que diz respeito ao patamar mínimo de competição. Agora, a desigualdade é como se tivéssemos uma corrida de Fórmula 1 na qual um corre com carro de corrida, um corre de bicicleta e o outro, de patinete.  Então, evidentemente, essa desigualdade não vai gerar resultados satisfatórios, adequados.
JU – Seu livro faz um levantamento histórico da questão.
Marcio Pochmann – O trabalho trata de um tema que é caro aqui no Instituto de Economia, explorando as diversas interfaces em que a desigualdade se manifesta no Brasil. Apresentamos uma discussão um pouco teórica, entendendo que a desigualdade é um elemento que funda e que se desenvolve no próprio capitalismo, seja ele qual for. 
No Brasil, tivemos uma situação extrema, porque praticamente até os anos 90, sobre os quais há dados que podemos comparar, tínhamos uma desigualdade que nos colocava entre os três países mais desiguais do mundo: uma desigualdade extrema, do ponto de vista econômico, do ponto de vista da renda. Nosso enfoque, no livro, é mais econômico, mas procuramos olhar também a questão da desigualdade no mundo, e como o Brasil se coloca.
Vemos a desigualdade que se verifica entre as classes: hoje, estamos caminhando para um mundo em que apenas 1% da população terá mais riqueza que 99% da população. Então, um mundo também muito desigual.
Depois, fazemos uma reflexão a respeito da desigualdade no Brasil, do ponto de vista das regiões, do território. Por exemplo, a desigualdade que há entre as nossas cidades, os nossos Estados, uma desigualdade que se manifesta do ponto de vista das classes sociais, aqueles que têm propriedade – propriedade da terra, propriedade de títulos financeiros – e a desigualdade entre os indivíduos, entre cor, raça, desigualdade de gênero. O livro na verdade oferece ao leitor uma série sistemática de informações quantitativas, empíricas, uma interpretação teórica e também experiências de outros países que enfrentaram com êxito a desigualdade, o que não é o nosso caso.
JU – Mas o país não fez progressos nos últimos anos?
Marcio Pochmann – Sim. Nós iniciamos o século 21 combinando crescimento econômico, a presença da democracia e de políticas públicas. Isso nos permitiu, comparativamente aos últimos 50 anos, oferecer resultados significativos na década de 2000. Que foi uma década em que a desigualdade aumentou no mundo, mas em que o Brasil, de forma inversa, conseguiu reduzir, pelo menos, a desigualdade na renda do trabalho. Nós, que éramos o terceiro país mais desigual do mundo, hoje somos o décimo-sexto. Houve uma redução, mas obviamente estamos muito longe, porque somos a sétima economia do mundo. Então, há muito o que fazer.
E entendemos que há, neste ano de 2015, um fato novo, que é um ponto de inflexão na trajetória de redução da desigualdade. Possivelmente teremos um retrocesso. Já estamos observando um aumento do desemprego e uma queda na massa de salários, diante inclusive dos lucros apresentados pelos bancos: deveremos ter talvez quase 10% do PIB transferido para o sistema bancário, em função das altas taxas de juros. Esse quadro põe um ponto de interrogação numa trajetória de redução da desigualdade.
JU – A escola de economia da Unicamp foi muito criticada, por conta da percepção de sua influência nas políticas econômicas do primeiro mandato de Dilma Rousseff, que desembocaram na situação atual...
Marcio Pochmann – Eu diria que há no Brasil, historicamente, uma tensão muito grande quanto à perspectiva do desenvolvimento econômico, entre o desenvolvimentismo e o que hoje é chamado de neoliberalismo. Há uma tensão entre os desenvolvimentistas e a escola que vê basicamente o desenvolvimento como produto do mercado, das forças do mercado. 
A Unicamp, a escola aqui de Campinas, de certa maneira encarna uma trajetória do pensamento desenvolvimentista que vem desde a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), do pensamento latino-americano. Existem outras escolas também na mesma perspectiva, mas a Unicamp, de certa maneira, caracteriza-se muito mais por trabalhar a perspectiva do desenvolvimento, e esse que já é um debate histórico entre liberais, neoliberais e desenvolvimentistas terminou, de certa maneira, identificado com a Unicamp. Eu não vejo isso necessariamente como um mal, já que marca a importância da escola de Campinas como referência nacional e internacional. 
Infelizmente, porém, estamos vivendo um momento de cólera, de ódio, que muitas vezes aquilo que é o nosso campo, que é o debate de ideias, acaba sendo ultrapassado por visões que a gente só pode lamentar, porque na verdade não são frutíferas.
A questão mais geral da disputa gira em torno do papel do Estado. Porque temos uma crença de que o capitalismo não se desenvolve, e nem resolve suas crises, que são inerentes, de modo próprio: ele pressupõe a ação do Estado.
Então essa é a grande diferença, porque há a crença, renovada em torno do neoliberalismo, que não cabe ao Estado qualquer ação porque, quanto mais houver liberdade da competição, mais ela, por si só, gera o desenvolvimento. Como se o desenvolvimento fosse algo espontâneo, autônomo. Nós não partimos desse pressuposto – acreditamos que o capitalismo, deixado livre à sua própria dimensão, produz mais crises. 
“Nós somos um país que se tornou república em 1889, e levou praticamente 100 anos para oferecer igualdade de acesso à educação básica”
“Estamos vivendo um momento de cólera, de ódio, que muitas vezes aquilo que é o nosso campo, que é o debate de ideias, acaba sendo ultrapassado por visões que a gente só pode lamentar”
“A gente aprende e ensina, aqui na escola, que não se faz ajuste fiscal numa economia que está em recessão, porque você corta gastos, isso reduz a atividade econômica e arrecada-se menos na sequência”
JU – O desempenho econômico do governo vem sendo usado como argumento contra o desenvolvimentismo.
Marcio Pochmann – É esquisito, porque a mesma tensão se dá em relação a uma das referências brasileiras para nós, o Celso Furtado. Críticas que se faziam ao governo do João Goulart, como sendo as razões dos problemas que então ocorriam, atacavam a perspectiva desenvolvimentista, e mesmo a pessoa do Celso Furtado. 
Quando ao governo da presidenta Dilma, a Unicamp participou dele, mas não em postos-chave. Não tivemos nenhum representante no Ministério da Fazenda. Temos ainda no governo o Luciano Coutinho [professor-titular do Instituto de Economia da Unicamp], que tem um posto importante, a presidência do BNDES, mas que não é o centro da condução da política econômica.
Por outro lado, a presidenta Dilma foi estudante aqui, o que é para nós motivo de orgulho.  José Serra, hoje senador, foi professor aqui do Instituto de Economia. Tivemos Paulo Renato, infelizmente falecido, que foi ministro da Educação. Temos o ministro Mercadante, hoje na Casa Civil. Então, a escola de Campinas tem produzido quadros que ajudam na condução da República.
JU – Qual sua avaliação do momento econômico atual?
Marcio Pochmann – Bem, entendemos que o Brasil não tinha esse problema fiscal como foi aventado em 2014, que de certa maneira acabou sendo a referência para que a presidenta Dilma viesse a tomar as medidas que tomou. Entendemos que, de fato, o ano de 2014 foi um ano que apresentou problemas fiscais, mas é preciso entender o porquê desses problemas.
 De um lado, a situação das contas públicas tem a ver com crescimento econômico. Se você tem crescimento econômico, tem mais arrecadação e melhora a situação fiscal de qualquer governo. Quando não há crescimento, você obviamente arrecada menos, como foi o caso em 2014. 
Ao mesmo tempo, em 2014 nós também tivemos o resultado da opção pelas chamadas políticas anticíclicas, uma série de desonerações, mais de R$ 100 bilhões deixaram de ser arrecadados para os cofres públicos, em função dessas desonerações. 
De modo que o problema fiscal tem a ver com essas questões. A gente aprende e ensina, aqui na escola, que não se faz ajuste fiscal numa economia que está em recessão, porque você corta gastos, isso reduz a atividade econômica e arrecada-se menos na sequência. Vira um ajuste fiscal quase permanente. O enfrentamento da questão fiscal passa pelo crescimento, não pela recessão.
JU – É possível reduzir a desigualdade sem causar conflitos na sociedade?
Marcio Pochmann – A melhor forma de distribuir é crescendo, porque quanto mais se cresce, mais fácil é distribuir. À medida que o crescimento é pequeno, para melhorar a condição de uns é preciso avançar sobre a participação na renda de outros. É aí que surge o conflito. E esse conflito ficou mais evidente, no nosso modo de ver, no governo da presidenta Dilma, porque a expansão econômica no seu primeiro governo, e aparentemente no início deste segundo, é muito menor do que fora no governo do presidente Lula. 
Mas à medida que o Brasil crescer mais, haverá mais possibilidades de distribuir renda. As décadas de 60 e 70 foram períodos em que o Brasil cresceu muito mais do que na década de 2000, mas não tinha democracia, não tinha política pública para distribuir, então formamos um país muito desigual. Nos anos 80 e 90, o Brasil voltou a ter democracia, mas não cresceu, então não tinha o que distribuir, a despeito dos avanços da Constituição de 1988. Nos anos 2000, a gente combinou os três: cresceu, com democracia e políticas públicas. Esta segunda década do século está em dúvida. Se não houver crescimento, dificilmente teremos condições de distribuir.
JU – Mas o Brasil não é muito dependente do cenário internacional?
Marcio Pochmann – Claro que o cenário internacional compromete. Agora, estamos na América Latina, e segundo a Cepal somente dois países não vão crescer: Venezuela e Brasil. Os demais vão crescer. Não tanto quanto gostariam, mas vão. Então, nós sofremos o regime de baixo dinamismo no mundo, mas temos as nossas questões a serem resolvidas internamente. 
JU – Quais os entraves?
Marcio Pochmann – A meu modo de ver, o principal é de natureza política. Não temos uma maioria política voltada para o crescimento e para a distribuição da renda. Somos hoje um país com 86% de sua população vivendo nas cidades, ou seja, a pauta da sociedade é numa pauta urbana. Mas o congresso que emergiu das eleições de 2014 fez com que a maior bancada fosse a dos ruralistas. Há um descompasso entre o que a sociedade precisa e demanda e os representantes que são os responsáveis principais por organizar a política pública no país.  
 
Capa do livro Desigualdade economica no Brasil
Serviço

Título: “Desigualdade Econômica no Brasil”
 
Autor: Marcio Pochmann
 
Páginas: 168
 
Editora: Ideias e Letras
 
Preço: R$ 35,00







http://www.unicamp.br/unicamp/ju/635/pochmann-ve-risco-de-retrocesso-na-reducao-da-desigualdade-no-pais

Muito longe da universalização

Pesquisa desenvolvida no Instituto de Economia aponta os maiores desafios do SUS

Mais de 26 anos após a sua criação, o Sistema Único de Saúde (SUS) ainda enfrenta grandes desafios para cumprir os princípios de universalidade, integralidade e equidade de acesso aos serviços de saúde para todos os brasileiros, formalmente estabelecidos na Constituição de 1988. O principal desafio para isso está na incompatibilidade do SUS com o contexto político e econômico vigente a partir dos anos 1990, quando o país aderiu à doutrina neoliberal. A conclusão é da economista Ana Paula Andreotti Pegoraro, na dissertação de mestrado “Estado e mercado na atenção à saúde no Brasil: os desafios da universalização do SUS”, orientada pelo professor Eduardo Fagnani e apresentada no Instituto de Economia (IE) da Unicamp.
“O Brasil continua sendo pautado por um tripé macroeconômico introduzido em 1999, após negociação do governo de Fernando Henrique Cardoso com o Fundo Monetário Internacional: o cumprimento de metas de inflação (tendo como instrumento a alta taxa de juros), o câmbio flutuante e o superávit primário (priorização do pagamento de juros da dívida pública em detrimento das contas correntes em saúde, educação, previdência, etc.). Isso é incompatível com o desenvolvimento social e, especialmente, com o SUS concebido para atender 200 milhões de pessoas. Os recursos para o sistema são parcos (e dificilmente virão mais), quando seriam necessários gastos muito maiores do que os efetivados”, afirma a autora da dissertação.
A economista Ana Paula Andreotti Pegoraro, autora da dissertação: “O Brasil continua sendo pautado por um tripé macroeconômico introduzido em 1999, após negociação do governo de FHC com o FMI”
Em sua pesquisa, Ana Pegoraro procurou delinear as relações entre os setores público e privado na assistência à saúde no Brasil em dois períodos distintos: o primeiro contempla os determinantes históricos do sistema de saúde do início do século XX até 1988; e o segundo abarca o pós-1990, quando o país faz a opção pelo neoliberalismo. “Desde os primórdios de sua formação, sempre predominou no sistema brasileiro um forte segmento empresarial operando a saúde em seus diversos componentes, o que responde em parte pelas deficiências estruturais do Estado. Este processo foi intensificado a partir da década de 1940, quando os Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP) passaram a contratar o setor privado para dar assistência médica aos seus filiados.”

A economista afirma que na ditadura militar este modelo foi ampliado à exaustão, tanto que quando o SUS foi criado em 1988, a grande maioria da oferta de serviços de saúde era pelo setor privado. “Na lei, o SUS é público; mas na prática, a oferta era privada. A mercantilização da saúde passou a ser motivo de grande disputa tanto no Parlamento quando no Executivo, e o SUS foi atropelado por este processo histórico de privatização reforçado pela hegemonia da agenda neoliberal. Este é o pano de fundo para se compreender os problemas atuais vividos pelo SUS, passados 26 anos da sua consagração formal pela Carta de 88.”
HISTÓRICO
Na economia cafeeira, conforme a autora da pesquisa, as preocupações dos governos no que concerne à saúde da população se limitavam à criação de condições sanitárias mínimas para as relações comerciais com o exterior e, também, para o êxito da política de imigração que pretendia atrair mão de obra visando à constituição do mercado de trabalho capitalista. “As instituições sanitárias priorizavam os grandes centros urbanos e os portos, enquanto os cuidados com a saúde da população de municípios do interior e de menor importância econômica eram bem rudimentares. Não se tratava de melhorar as condições de vida da população, e sim de defender os interesses pré-capitalistas através da acumulação cafeeira.”
A dissertação traz um histórico da previdência social desde as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs), criadas em 1923 e organizadas por empresas e empregados de cada setor produtivo – marítimos, comerciários, bancários, ferroviários, transportes e cargas, servidores públicos. Já aos demais trabalhadores não filiados a tais entidades, restavam os serviços públicos ou outras formas de assistência médica, que eram precárias, restritas e muitas vezes provindas de doações. “As CAPs operavam em regime de capitalização e eram muito desiguais, pois quanto mais forte o setor, como dos bancários, maior era o poder de barganha com os patrões.”
Ana Pegoraro conta que, em 1930, Vargas promoveu uma reestruturação do sistema, substituindo as CAPs pelos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), na condição de autarquias em nível nacional centralizadas pelo governo federal; ou seja, decidiu-se que o Estado responderia a esta questão social de forma universal, ao invés de tratá-la de forma parcial e pontual. “A filiação passou a se dar por categorias profissionais e não mais por empresas. Os IAPs respondiam tanto por serviços de previdência (afastamento ou aposentadoria) como pelos serviços de saúde, bancados por recursos públicos, dos empresários e dos trabalhadores.”
Segundo a pesquisadora, a nova dinâmica de acumulação subordinada ao capital industrial fez surgir outras necessidades e aumentar a pressão pela ampliação e criação de políticas sociais. “A política nacional de saúde estava organizada em dois subsetores: de saúde pública, prestada por instituições estatais para toda a população; e de medicina previdenciária, com serviços oferecidos de forma restrita a alguns trabalhadores urbanos. Havia uma significativa diferença na forma de financiamento: as instituições públicas contavam com escassos recursos orçamentários, enquanto as instituições previdenciárias eram financiadas por contribuições dos trabalhadores, impulsionadas com o desenvolvimento econômico e o crescimento da massa salarial.”
A economista acrescenta que o setor de atenção médica no Brasil, à semelhança do que ocorre em outros países, cresce aceleradamente em importância econômica, mobilizando um volume cada vez maior de recursos e permitindo maior acumulação de capital em seu interior. “Este modelo de organização institucional, calcado na segmentação e na discrepante diferença de financiamento, beneficiou o financiamento do setor privado através da canalização de recursos da saúde previdenciária para a construção e expansão de hospitais privados. Nesse sentido, criou mecanismos para que o setor privado ganhasse força e se estruturasse de forma a ter capacidade de defender seus interesses em possíveis tentativas de reestruturação do sistema público.”
TENSÃO PREVALECE
Ana Pegoraro destaca em seu estudo que a saúde ainda não podia ser considerada um negócio em 1964, mas a clara divisão entre medicina curativa e medicina preventiva, e as abordagens distintas para distintos segmentos da incipiente classe trabalhadora brasileira, deram os primeiros sinais do grande mercado que se tornaria a saúde no Brasil. “Durante a ditadura militar, de 64 a 85, temos um período de modernização conservadora, com uma expansão dos bens públicos ofertados pelo setor privado. Uma modernização, porém, assimétrica em termos regionais, concentrada na região sudeste, que privilegiava a medicalização em detrimento da prevenção. Além disso, não era universal: para ser atendido no sistema ainda era preciso apresentar a carteira de trabalho.” 
A pesquisadora destaca, por outro lado, a existência de diversos serviços públicos de atenção à saúde, como Fundação Oswaldo Cruz, Instituto Butantan e escolas, hospitais e centros de saúde que asseguraram uma das bases para o projeto de um sistema nacional de saúde no Brasil. “Nesse aspecto, a construção do Sistema Único de Saúde (SUS), inspirado nos valores do sistema de proteção social (Welfare State) formado na Europa do pós-Guerra, veio se opor ao modelo médico assistencial privatista hegemônico durante a ditadura militar. A lógica do seguro, em que se paga para ser assegurado, prevaleceu até a Constituição de 88, quando então se implantou o conceito de seguridade, em que basta ser cidadão brasileiro para ter acesso ao sistema de saúde.”
A autora da pesquisa afirma que a globalização dos anos 80 e a adesão do país ao neoliberalismo nos 90 tiveram como consequências a desestruturação dos pilares do Estado brasileiro e a fragilização dos seus instrumentos de atuação, dificultando manter e garantir os direitos de acesso a bens e serviços de saúde. “A agenda liberal e conservadora, com destaque para as diretrizes e orientações políticas do Banco Mundial de incentivo à expansão da iniciativa privada nos serviços de saúde, é antagônica aos princípios do SUS. Na prática, o sistema de saúde passou a viver tencionado entre o que reza a Constituição e o contexto político e econômico favorável aos mercados desregulados – e a privatização da saúde ganhou novo fôlego.”
Ana Pegoraro recorda um debate surgido na banca examinadora, dando conta de que embora a Constituição garanta a todos os brasileiros o direito à saúde universal, igualitária e equitativa, esta garantia é muito mais formal do que efetiva. “A Carta de 88 diz que a oferta será pública, mas para isso seriam necessários hospitais públicos, especialmente nas regiões mais pobres do país, o que teria demandado enormes investimentos; mas, no contexto do ajuste macroeconômico ortodoxo, central na agenda dos governos, esses investimentos não ocorreram de forma significativa. Recentemente, o Congresso aprovou um projeto prevendo o ingresso de capital internacional nos serviços de saúde do Brasil. Trata-se de mais um golpe no SUS, ampliando ainda mais a participação privada na captura dos recursos públicos.”
A mestre em economia finaliza com outro aspecto discutido na banca, relacionado aos planos de saúde, serviço privado que floresceu com o neoliberalismo. “A história econômica do século XX é marcada pela diferenciação social. A desigualdade faz com que as pessoas busquem ascender socialmente e o tipo de assistência à saúde também é uma forma de diferenciação. Talvez a classe média não queira que o SUS dê certo, pois significaria ser atendida por um mesmo médico ou hospital, ainda que isso seja perfeitamente natural nos países desenvolvidos. Plano de saúde também é demonstração de status, juntamente com o carro e a casa própria. Sem mudar essa estrutura social, não haverá respaldo para manutenção do SUS.”

Publicação
Dissertação: “Estado e mercado na atenção à saúde no Brasil: os desafios da universalização do SUS”
Autora: Ana Paula Andreotti Pegoraro
Orientador: Eduardo Fagnani
Unidade: Instituto de Economia (IE)

http://www.unicamp.br/unicamp/ju/635/muito-longe-da-universalizacao