Mais uma vez, pela
quinta, sexta, sétima, sei lá eu..., uma epidemia de Dengue
avassala aqui a cidade, o estado. Pessoas morrendo. Um rapaz forte
esses dias morreu, estava com Dengue. Disseram-me que um dos seus
rins ficou necrosado, em consequência dessa doença.
E nos jornais, a
imprensa, não para de falar nisso. E aparece até um ranking de
pessoas mortas. E aparece até um ranking de casos notificados. De
casos confirmados. E o prefeito fala. E os secretários de saúde
também. E vemos coletivas sobre o assunto. E os doutores também
falam. E aparecem novas explicações, métodos, variáveis,
estatísticas. E faz-se mutirão. E testa-se a vacina. E “dale”
gente. E fala-se de uma “força tarefa de Combate a Dengue” –
prioridade vermelha. E contratam-se médicos às pressas
temporariamente. E as unidades, postos de saúde, emergência e
hospitais, ficam “abarrotados”. E só se fala nisso, e só se
focaliza a Dengue. E os profissionais de saúde esquecem outras
doenças e problemas de saúde da população. E os profissionais de
saúde também “pegam” Dengue (conversei com uma colega médica,
com Dengue hoje). Um agente comunitário de saúde, uma vez me disse
que havia “pego” Dengue umas 5 vezes já. E é somente as metas e
indicadores relacionados a Dengue, que são a prioridade. E pelo
menos na área da saúde, parece que o ano somente começará, depois
da Dengue (como aquele negócio que diz que o ano no Brasil, para
começar a andar principalmente nas repartições públicas, só
depois do Carnaval... aqui, na área da saúde, só depois da
Dengue...).
O CIRCO DA DENGUE ESTÁ
ARMADO NOVAMENTE!
E muitas pessoas ficam
adoecidas, inclusive crianças, gestantes e idosos. Algumas delas
morrem, como citei acima. E pessoas chorando, tristes. E pessoas
cansadas, abatidas, até desesperadas, nas longas filas para um
atendimento (a todo e qualquer horário do dia e noite).
Esses dias li uma
matéria, em que uma comerciante fechou seu negócio por tempo
indeterminado (acho que ela tem uma padaria), e com um aviso na porta
justificou-se: estou com DENGUE.
Dengue,
vem de dengoso. Esse nome foi dado, eu acho, naquela época em que se
classificam elas (as doenças) a partir dos nossos “humores”, ou
mais ou menos isso. Mas vou te contar uma coisa, DENGUE, não tem
nada haver com essa coisa de dengoso não. Já tive Dengue uma vez. E
é uma sensação horrível. Dizem que a sintomatologia, bem como a
intensidade dos sintomas, varia de uma pessoa a outra. Óbvio. Mas
uma sensação em comum, a quase todas as pessoas que já conversei,
e que já tiveram Dengue, é de um extremo mal-estar. Não te dá
vontade de fazer nada. Eu não queria nem mesmo ficar “deitadão”,
assistindo um bom filme. Tive febre, vermelhidão pelo corpo,
cefaleia forte, e um incômodo terrível nas minhas vias
respiratórias. Uma coisa muito esquisita. Parecia um “pigarro”
que não saia da parte interna do meu nariz. E não dá vontade de
fazer nada, nem mesmo de ficar acordado e dormir. E às vezes vem
mesmo aquele pensamento: agora eu vou morrer...
É um negócio feio. Pelo
menos comigo foi. Mas mesmo assim, quase me arrastando em alguns
momentos, em todos os dias da doença no meu corpo, quando ela
chegou, saiu, e depois retornou (na verdade ela não sai, dizem que
fica “incubada”), eu fui trabalhar. Com o corpo todo doído: “é
que tive a doença no primeiro mês do meu primeiro emprego
praticamente, depois de formado”. Enfim, que puta azar...
E
agora, as autoridades e especialistas explicam/justificam: é um novo
tipo de vírus, Dengue do tipo 4. E em outros momentos, a imprensa e
essas autoridades realocam a culpa no povo. É a questão do lixo,
que as pessoas amontoam em casa... enfim, um questão relacionada a
CULTURA do povão. E eu também acho que existe muito bem essa
correlação: epidemia de DENGUE X CULTURA.
Uma
vez, em um curso sobre EDUCAÇÃO EM SAÚDE, perguntaram para nós,
alunos, a diferença entre PREVENÇÃO E PROMOÇÃO de Saúde? O que
diferenciaria esses dois conceitos tão presentes na área da saúde?
E pediram para que déssemos exemplos de programas, projetos, ações
e atividades de saúde, que demonstrassem essas duas posições.
Pelo
que eu me lembre, o exemplo que eu citei na prova, foi o programa de
saúde voltado ao combate a Dengue. Escrevi que esse programa, por
muito tempo, talvez até os nossos dias atuais, eu percebia ter muito
a conotação “preventiva”, em suas ações. Era aquela coisa de
se fazer uma mobilização grande, na época das chuvas, no verão,
na tentativa de mobilizar as pessoas para, por exemplo: não
acumularem recipientes contendo água parada em suas casas.
Também, seria somente
nessa época específica do ano, que ocorriam: as ações nas
escolas, as gincanas nos bairros (de quem trouxesse mais pneus
abandonados...), as propagandas na TV, folhetos e cartazes, etc. e
tal, com o objetivo de que a Dengue não se alastrasse. Porém,
passados alguns meses, e a chuva findada, essa temática da “Dengue”,
saia das pautas de saúde, e das discussões.
Aí, o que acontecia, é
que talvez novamente, as pessoas “relaxavam”, e aqueles “ovinhos”
da “mosquita” que ficavam armazenados nos objetos que tempos
antes continham água, no ano seguinte, com as chuvas, eclodiam. E os
índices relacionados a DENGUE, voltavam a zero em termos de combate,
ou até pioravam. E começava-se tudo outra vez.
(Até que em anos
anteriores, eu percebia esse ”circo”, sendo montado de ano em
ano. Agora, parece que ele está levando um tempo maior para
reaparecer.)
Acho
que algumas das experiências que eu citei acima, esse quadro,
poderia se aproximar mais de uma perspectiva “preventiva” em
saúde. Seja pelo seu caráter provisório, pontual, sazonal, e até
mesmo, talvez: “superficial”.
Passando-se
os anos, com a situação piorando em torno da Dengue, como
percebemos, esse tema começa a ser discutido pelo menos por aqui, em
alguns locais e por algumas pessoas, de modo mais “incisivo” e
“prolongado”. E dá a esperança, de que talvez o programa
voltado para o combate a Dengue, adote medidas mais influenciadas
pela perspectiva da “promoção em saúde”, do que do da
prevenção.
Mas será que essas
discussões estão se aprofundando satisfatoriamente, mediante um
problema tão complexo? Com uma melhor “qualidade” e eficácia em
suas atividades e ações?
Há
um tempo, eu já escutei que a DENGUE, é uma doença essencialmente
(encontra-se) de países subdesenvolvidos, ou se preferir, em
desenvolvimento. Lá para aquelas bandas da Europa, como nos EUA, não
tem essa doença não. Está erradicada! Dessa mal o povo também não
sofre por lá.
Ainda
sobre a Promoção de Saúde em Dengue (no intuito de tentar
“ampliar” um pouco essa temática) como também em qualquer outro
problema de saúde, essa questão “cultural” é fundamental. E é
esse trabalho relacionado a nossa cultura, almejando as
transformações sociais e comportamentais, que um trabalho em
promoção de saúde pretende.
Porém cadê as tais
mudanças? Parece elas ainda não estarem ocorrendo...
Com relação às
mudanças, falando de nosso “macro contexto”, o que percebo
atualmente, é que as únicas mudanças que vemos realmente acontecer
em nosso país, em nossa sociedade, ainda, acontecem apenas âmbito
econômico. E parece ser ele o único a ser objetivado/ trabalhado.
Por exemplo, o aumento no
número de pessoas, tendo acesso ao mercado de consumo, cresceu
bastante no Brasil. E isso, pode nos proporcionar à ilusão de
estarmos de certa forma “crescendo”, nos “desenvolvendo”.
Tanto no âmbito individual, como no coletivo. E claro que a
economia, é axiomaticamente importante a todos nós.
Mas fica até parecendo
um paradoxo pois: aqui ainda, na cidade, existe a propaganda, de que
vivemos em uma cidade com um dos melhores índices nacionais em
qualidade de vida, e que ela “não para de crescer”. E um
mosquitinho de nada... que chupa umas gotinhas do nosso
sangue...coloca tudo a perder...toda essa “qualidade de vida”...
Agora, história
interessante do qual eu quero falar, é de uma experiência de
combate a Dengue, que ouvi falar estar acontecendo, em algumas
cidades do interior de São Paulo e que estão dando ótimos frutos,
para ser mais preciso, na pior das hipóteses, lindas flores...
Há tempos atrás, estava
eu, visitando os meus pais (na cidadezinha do interior do estado),
quando vi dentro de um “saquinho”, algumas sementes e um pequeno
panfleto, contendo informações de como plantá-las da maneira
correta. Era algo que a prefeitura estava disponibilizando, pois
havia as siglas da prefeitura e da secretaria de saúde do município,
e também a “logo” do - “Combate a Dengue”.
Conversando com meus
familiares, sobre aquelas sementes, confirmaram para mim que era
mesmo a prefeitura, que estava distribuindo-as de casa em casa, para
que as pessoas as plantassem, em suas próprias residências. O
motivo da jardinagem coletiva, seria de que aquela planta, ajudava no
controle dos casos de Dengue. O esquema é que a pessoa deveria
plantar, para que as plantas atraíssem as libélulas, e as libélulas
se alimentassem dos mosquitinhos da Dengue. Simples assim! Isso
poderia diminuir consideravelmente, a incidência dos mosquitos na
casa, na cidade!
E hoje, eu conversando
com uma colega sobre a Dengue, ela me disse que está também,
distribuindo por aqui essas sementes com o mesmo intuito. E, além
disso, por meio de uma parceria na comunidade que conseguiu, que
trabalha com o cultivo de plantas, daqui a algumas semanas, estará
ao invés das sementes, distribuindo já as mudas dessas plantas,
feitas pelos parceiros, para a população do bairro.
Pensando, achei essa
história toda muito interessante.
Uma das primeiras coisas
que me veio a cabeça, foi a questão da complexidade que envolve um
problema de saúde. Como sempre. Depois, pensei em toda a simbologia
que essa história do combate a Dengue com uma planta, pode carregar.
A proposta, é de que
simplesmente plantemos uma planta. O que já é uma coisa muito
diferente (quantos de nós, já fez isso?)! Depois, devemos cuidar
dessa planta, o que exige um mínimo de dignidade do cuidado, por
parte da pessoa (eu mesmo, já matei samambaia de sede na minha
casa). E, ampliando a proposta, podemos pensar que essa história,
envolve toda a questão do nosso ecossistema, ecologia, desse
“lugarzinho” onde vivemos e morremos.
Muito da Dengue, como
sabemos, tem relação, e é ocasionada devido à água parada,
dentro das nossas próprias casas, em recipientes que deixamos por
aí, oriundos, por exemplo, das bugigangas que compramos e que cada
vez mais, entopem nossos espaços domiciliares. Ou até mesmo, da
água dos vasos de outras plantas.
E está também
relacionada “a cidade”. E em como elas veem crescendo de maneira
desordenada. Se concretando tudo por aí. E com os terrenos baldios
“abandonados”, maltratados e sujos, com mato “dessa altura”,
pela especulação imobiliária. E as casas “sem uso”, fechadas,
trancadas. Relacionada a questão do Saneamento Básico, pois já se
sabe que não é somente em “água fresca e parada” que o
mosquito senta, pois já acharam ovos por aqui, em “água de
fossas”. Foram encontrados focos do mosquito, até na água parada,
daqueles buracos nas ruas, que estragam as rodas dos carros, disse-me
uma mulher, de uma comunidade uma vez. Está relacionada, com a
simples questão de se jogar uma tampinha de garrafa no chão
esquecida, e ela cair e ficar de “cabeça” para cima (ou pra
bairro?) (como um “copinho” armazenando a água), podendo se
transformar em um “criatório”. E até em casca de ovo de galinha
usado, já se encontrou larvas.
Está relacionada com a
questão da vizinhança, pois não adianta eu cuidar do meu quintal,
e o vizinho da rua ao lado, não estar “nem aí” para o dele
desleixado. O mosquito pode percorrer voando mais de 40 metros... e
ele pode sair para conhecer a vizinhança... Está também
relacionado a questão de quem pode morar ou não, em um prédio
alto, como aqueles privilegiados do centro da cidade. Os que podem,
estarão menos expostos ao perigo de serem picados pelos mosquitos. A
que a última notícia que eu fiquei sabendo sobre a Dengue, é que
as correntes naturais de ar (os gostosos ventos), fazem a pequena
estrutura corporal mosquética, não aguentar subir voando, para os
apartamentos de andares mais acima.
(No
Pantanal, considerado como um dos santuários ecológicos do planeta, é também um
dos santuários de mosquitos. E lá era fácil empiricamente perceber, que ao
vestir uma roupa mais escura, os mosquitos "atacavam" você com mais
insistência, do que se estivesse usando uma roupa mais clara. Chegava a arder
as pernas, de tantas picadas. Até mesmo no rosto, eles não perduavam. E já
presenciei, mosquitos picando, mesmo a pessoa tentando se proteger deles, com
calça jeans e blusas compridas e grossas. Eles tinham a pachorra de perfuram
esses até esses tecidos. Lembrei-me de uma nota que li numa revista (que eu
achei muito cômica), de que os mosquitos, picavam mais os membros inferiores,
como os pés, pois eram atraídos pelo odor do "chulé").
Assim, é um “problemão”
mesmo. E que envolve muitas coisas. E é somente um trabalho estando
atento, a essas e outras muitas questões, é que poderá fazer a
população no mínimo, refletir sobre a Dengue. Não serão apenas
os 20 segundos de propaganda na TV, muito menos as “palestrinhas”
de 10 minutos nas escolas e unidades de saúde, que farão amenizar,
pelo menos um pouco, toda essa calamitosa situação.
Mas fica essa experiência
da Crotolária (esse é o nome da charmosa plantinha), para
pensarmos.
Pode ser que plantando
uma planta na terra, plantemos uma ideia diferente em nossas cabeças
também.
Abaixo, as imagens da
possível “salvadora da pátria” - “Crotolária”, e da
poética “Libélula”.
Lembrei-me de quando
eu era criança, e perto do rio, quando avistávamos uma, chamávamos a Líbélula de
“helicópterozinho”. Sempre a víamos voando bem rende a água,
num belo voo rasante...
Nenhum comentário:
Postar um comentário