Latifúndios pagam apenas 0,04% do total de impostos do país
na Rede Brasil Atual
São Paulo – Com tributações
desatualizadas e reduzidas, os latifúndios pagaram em 2011 apenas 0,04% de todos
os impostos arrecadados pela União (governo federal, estados e municípios),
segundo cálculo do Dieese publicado na cartilha
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Ideias para uma Tributação mais Justa, lançada este mês, em São Paulo.
O Dieese ainda não tem os dados fechados de 2012, mas já sabe que, em relação à
arrecadação federal (R$ 992 bilhões), os grande proprietários arcaram com menos
de 0,07%.
“Além de os impostos serem baixos, o
problema é reforçado porque os latifundiários designam grandes extensões das
suas propriedades como área de conservação, que não são oneradas”, explica o
responsável pela publicação, Clóvis Scherer. Em 2012, o agronegócio faturou R$
357,3 bilhões, 8,7% a mais do que em 2011, segundo a CNA (Confederação Nacional
da Agricultura), e pagou cerca de R$ 670 milhões em impostos.
As propriedades com mais de mil
hectares, ou 10 milhões de metros quadrados, representam apenas 0,92% dos
estabelecimentos agropecuários do país. Em contrapartida, correspondem a 45% da
área total das propriedades rurais, de acordo com o Censo Agropecuário do IBGE,
de 2006. “O ideal seria que o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural
(ITR) fosse menor para os pequenos produtores ou para os voltados exclusivamente
para produção de alimentos”, sugere Scherer.
O deputado federal Julio César (PSD),
membro da Comissão da Agricultura da Câmara e integrante da Frente Parlamentar
Agropecuária, concorda que os impostos sobre a terra são baixos. “É difícil
atualizar as propriedades, como acontece todos os anos, com o IPTU. O ideal
seria que o município, que está mais próximo, cadastrasse as propriedades e
fizesse a atualização”, sugere.
O professor de geografia agrária da
Universidade de São Paulo (USP) Ariovaldo Umbelino afirma que, em geral, os
pequenos produtores se preocupam mais em pagar os impostos, mesmo sendo
posseiros e a terra sendo pública. “Isso porque o imposto comprova que eles têm
a posse e que estão produzindo”, explica. “Os grandes sabem que não vão ser
penalizados. O imposto territorial é baixíssimo e o governo nunca usou dos
mecanismos que a lei permite para cobrar dívidas e expropriar
terras.”
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“O Brasil é governado pelas elites
latifundiárias e elas não têm interesse em tributar a terra”, avalia o
professor. “Proporcionalmente, pagam mais impostos os brasileiros que ganham
menos, porque nosso sistema tributário está montado em cima da tributação do
consumo. Nos Estados Unidos, por exemplo, o que é tributado é a renda. Aqui quem
tem renda não paga.”
Outro fator que dificulta a cobrança de
impostos, segundo Umbelino, é a falta de documentação das grandes propriedades
de terra. “A maior parte das terras é grilada, não tem documento e não precisa
pagar impostos. Elas não existem para o fim de legislação. Nenhum estado
brasileiro fez o levantamento das terras públicas devolutas e elas acabam
ficando sob controle de fazendeiros”, diz.
“Nem o Incra, nem órgãos estaduais de
terra, nem cartórios são capazes de dizer quem é dono do quê. Isso sem falar nas
propriedades que os juízes autorizaram a titulação, digamos, por desconhecimento
da lei”, critica. “É anticonstitucional um juiz dar usucapião a uma terra
pública. Porém, eles se baseiam apenas no Código Civil, que de fato garante a
posse para o posseiro, que nunca teve terra nenhuma.”
Improdutividade e tributos
A baixa tributação das terras favorece
a manutenção de latifúndios improdutivos para especulação, de acordo com
Umbelino. “A terra no Brasil não é apropriada para a produção. Ela é usada como
reserva patrimonial, como garantia para conseguir crédito no sistema financeiro.
Por isso, as grandes empresas procuram ter terras”, afirma.
Em 2006, 48,37% dos 5.175.636
estabelecimentos agropecuários do país eram utilizados para lavouras
(permanentes e temporárias), forrageiras, cultivo de flores, pastagens e
sistemas agroflorestais, segundo o Censo Agropecuário do IBGE. O restante é
composto por áreas de pastagens degradadas e naturais, matas e florestas para
preservação, áreas alagadas, benfeitorias e terras degradadas ou inaproveitáveis
para o cultivo. Não há dados específicos sobre terras
improdutivas.
O deputado federal Nelson Padovani
(PSC-PR), integrante da Comissão de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento
Rural, avalia que o imposto sobre a terra e sobre o produtor rural é muito
elevado. “A produção agrícola é insegura. Com secas ou geadas, o produtor perde
em uma madrugada tudo o que investiu, e não há um fundo nacional para
protegê-lo. Grande parte dos agricultores paga para produzir”,
diz.
Padovani discorda da proposta de onerar
mais os grandes produtores para reduzir as alíquotas sobre os pequenos. “Todos
nós estamos sujeitos à mesma insegurança e já temos uma série de outros impostos
sobre a produção. Sou contra qualquer imposto aplicado sobre produtores, grandes
ou pequenos. As empresas são beneficiadas pelo governo com uma série
desonerações. Nós não.”
Scherer discorda. “Se um industrial ou
um comerciante urbano paga IPTU e todos os outros impostos sobre os lucros e
trabalhadores, os produtores rurais também devem pagar pela terra. O que precisa
ser revisto é o percentual reduzido que os grandes pagam”, diz.
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